Aspectos da luta entre as tropas americanas e alemães nas sebes normandas, após os desembarques do Dia D, na França.
Sob nenhum aspecto, os soldados alemães que lutavam na Normandia eram combatentes indecisos. Muitos lutaram efetivamente; alguns combateram magnificamente. Em St.-Marcouf, a cerca de dez quilômetros ao norte da praia de Utah, os alemães tinham quatro casamatas enormes, cada uma abrigando um canhão de 205mm. No Dia D, essas armas travaram duelo com navios de guerra americanos. No dia seguinte, soldados da 4ª Divisão de Infantaria cercaram estas casamatas. Para mantê-los afastados, o comandante alemão solicitou cobertura de outra bateria de canhões de 205mm, localizada a cerca de 15 quilômetros ao norte dali, bem acima de sua própria posição. Isso manteve os americanos longe por mais de uma semana, enquanto o canhão alemão continuou a disparar esporadicamente contra a Praia de Utah.
Os disparos contra a casamata foram precisos e a atingiram diversas vezes em cheio, sempre com projéteis de grande calibre, mas estes produziram apenas pequenas concavidades no concreto. Essas casamatas ainda existem - ficarão lá por décadas, senão séculos, de tão bem construídas que foram. São um mudo testemunho da resistência dos alemães. Durante oito dias, as guarnições de seus canhões ficaram confinadas nelas - sem nada para comer, exceto pão dormido e água de má qualidade; nenhum lugar para o alívio das necessidades; barulho ensurdecedor, vibrações, concussões, poeira em toda a parte. Apesar de tudo, eles continuaram com os disparos. Desistiram somente quando sua munição se esgotou.
Entre outros grupos de elite alemães na Normandia havia o dos pára-quedistas. Eles formavam um corpo de combate inteiramente diferente das tropas alemães lotadas na União Soviética e na Polônia. Partindo da Bretanha, a 3ª Divisão de Fallschirmjäger travou combate pela primeira vez na Normandia em 10 de junho, depois de dez dias de viagem de caminhão. Era uma divisão completa , com 15.976 homens em suas fileiras, formada por jovens voluntários alemães em sua maioria. Embora inexperiente em matéria de combate, tinha sido organizada e treinada por um experiente batalhão de pára-quedistas da campanha da Itália. Seu treinamento fora rigoroso, e a ênfase dada à iniciativa e à improvisação. Seu equipamento era notável.
Os Fallschirmjäger eram, talvez, os mais bem armados soldados de infantaria do mundo em 1944. Sua unidade, a 3ª Divisão, tinha 930 metralhadoras leves, 11 vezes mais do que seu principal oponente, a 29ª Divisão de Infantaria Americana. Suas companhias de fuzileiros tinham 20 metralhadoras MG 42 e 43; as companhias de fuzileiros na 29ª Divisão tinham duas metralhadoras e nove BARs. No âmbito dos esquadrões, os soldados americanos tinham um único BAR; o esquadrão de pára-quedistas alemão tinha dois MG42 e três submetralhadoras. Os alemães tinham três vezes mais morteiros que os americanos, e de maior calibre. Portanto, em qualquer encontro entre números semelhantes de americanos e Fallschirmjäger, os alemães tinham um poder de fogo de seis a vinte vezes maior.
E esses combatentes alemães estavam bem preparados para o combate:
- Esses alemães são os melhores soldados que já vi. São inteligentes e ignoram o significado da palavra "medo". Eles avançam e continuam vindo até que façam seu trabalho ou você os mate - disse, como comentário, um dos comandantes de batalhão da 29ª Divisão a um colega de outro regimento.
Esses eram os homens que tinham que ser arrancados das sebes. Um por um. Havia, em média, 14 sebes por quilômetro na Normandia. O custoso e enervante processo de preparação para o ataque, a realização dele, seu eventual sucesso e a subseqüente operação de limpeza levavam meio dia ou mais. E, no fim da operação, outra sebe os aguardava a cerca de 200 metros de distância. Ao longo de toda a Península de Contentin, do dia 7 de junho em diante, os soldados americanos penaram no afã de superar estas sebes. Puxaram e empurraram apetrechos e equipamentos e lutaram e morreram fazendo isso, para a conquista de duas sebes por dia.
Nenhum terreno do mundo foi mais apropriado ao combate defensivo com as armas da quarta década do século XX do que o formado pelas sebes da Normandia, e somente a lava e os corais, as cavernas e os túneis de Iwo Jima e Okinawa lhe foram tão favoráveis.
As sebes normandas remontavam à época dos romanos. Eram cercas de terra para confinar o gado e demarcar limites. Tipicamente havia apenas um local de acesso a cada um dos pequenos campos fechados pelas sebes, as quais eram irregulares, tanto no comprimento, quanto na altura e cuja disposição formava estranhos ângulos. De um modo geral, a galhada de suas árvores e de seus arbustos se encontrava por sobre as vielas, o que dava aos soldados a impressão de estarem presos num túnel de vegetação. Para onde quer que olhassem, sua visão era bloqueada por paredes de folhas e galhos.
A realização de uma ofensiva nas sebes era um empreendimento arriscado, oneroso, demorado, acompanhado por vezes de muita frustração. Era como combater em um labirinto. Pelotões viam-se completamente perdidos passados alguns minutos do lançamento de um ataque. Esquadrões se separavam involuntariamente. Não raramente, dois pelotões da mesma companhia podiam ocupar campos adjacentes durante horas antes de descobrir a presença de cada um. A pequenez dos campos limitava a disposição de tropas; pouquíssimas vezes, durante a primeira semana de combate, uma unidade como uma companhia iniciava um ataque sem sofrer baixas.
Onde os americanos se perdiam, os alemães se sentiam em casa. Havia meses que a 352ª Divisão Alemã estava na Normandia treinando para enfrentar os inimigos nas sebes. Além disso, os alemães eram geniais na utilização das possibilidades de fortificação desses obstáculos. Nos primeiros dias da batalha, muitos soldados foram feridos ou mortos, pois irrompiam pelas aberturas nas sebes em demanda dos campos, em seguimento da tática de batalha agressiva que lhes fora ensinada, e eram detidos pelo fogo de metralhadoras ou morteiros (os morteiros foram a causa de três quartos do total de baixas na Normandia).
Os manuais de táticas de guerra do exército americano enfatizavam a necessidade de cooperação entre unidades blindadas e de infantaria. Mas na Normandia, as guarnições de tanques não gostavam de entrar nas encovadas ruelas, em razão do espaço insuficiente para girar a torre de tiro e visibilidade deficiente para empregar o poder de fogo do canhão e das metralhadoras de longo alcance. Mas a permanência nas estradas principais mostrou-se algo impossível; os alemães ocupavam as elevada regiões interioranas e tinham seu canhão de 88 mm posicionado para cobrir, com seu poder de fogo, grandes extensões ao longo das estradas. Assim, por força das circunstâncias, os tanques entraram nas vielas, mas se viram restringidos em sua mobilidade. Tentaram sair para os campos e não conseguiram. Quando apontavam em uma abertura que dava acesso a um deles, o fogo dos morteiros e dos Panzerfaust (lançadores portáteis de granadas-foguete antitanque) os tirava de combate. Na verdade, freqüentemente os faziam "ferver" ou incendiar-se - seus operadores começaram a descobrir que seus tanques tinham a angustiosa tendência de pegar fogo.
Algumas guarnições tentaram superar ou romper as sebes com seus veículos, mas elas se mostraram obstáculos quase insuperáveis pelo tanque americano M4 Sherman. Incontáveis foram as tentativas para se tentar fazer isso, mas o Sherman não era suficientemente forte para romper sua base, de consistência semelhante ao concreto, e, quando conseguia escalar o paredão da sebe e lhe alcançava o topo, seu chassi desguarnecido de blindagem ficava exposto ao Panzerfaust. Ademais, a coordenação entre as guarnições dos tanques e as infantarias era quase impossível naquelas condições de combate, já que não dispunham de um meio fácil ou confiável de se comunicarem uns com os outros.
O Tenente Sidney Salomon, do 2º Batalhão de Tropas de Assalto, um dos heróis do Dia D, descobrira isso no dia 7 de junho. Então, ele estava conduzindo os sobreviventes de seu batalhão, o qual desembarcara em Omaha, no flanco direito do inimigo e estivera envolvido em um tiroteio que durara um dia inteiro, no Dia D, em direção ao oeste, pela estrada litorânea que levava a Point-du-Hoc. Três companhias do 2º de Topas de Assalto haviam tomado a plataforma da artilharia alemã assentada aí e destruído a artilharia de costa, mas enfrentavam agora grande contra-ataque e sofriam preciosas baixas. Salomon tinha pressa em destruir o inimigo.
Mas essa coluna, marchando em formação de combate, começou a sofrer ataques de artilharia pesada. À direita Salomon avistou uma igreja normanda, seu campanário era o único ponto elevado nas redondezas. Estava certo de que os alemães tinham um observador vigiando dali as peças de artilharia. Por trás de Salomon, um Sherman se aproximava, o único tanque americano que seria visto ali. O tenente queria que o veículo elevasse seu canhão de 75mm em direção ao campanário para destroçá-lo, mas com o tanque inteiramente fechado, não conseguiu chamar a atenção da guarnição, mesmo quando golpeou o lado do blindado com a coronha de seu fuzil. "Assim, numa atitude extrema, pus-me no meio da estrada, agitei os braços e apontei em direção à igreja. Deu resultado. Depois de alguns disparos do canhão e de algumas rajadas de .50, o guardador de artilharia alemã não existia mais.
Em que pese a ousadia de Salomon, era óbvio que o exército teria que engredar um bom sistema de comunicação tanques-infantaria, ao invés de fazer com que seus oficiais pulassem na frente dos blindados americanos para se comunicar. Até que isso fosse feito, os tanques desempenhariam apenas um papel secundário de apoio à infantaria, entrando no próximo campo depois que os soldados o tivessem ocupado.
O I Exército Americano não tinha produzido nada que se aproximasse de um corpo de instruções de ofensiva nas sebes. Despendera grande energia para enviar tanques em grande quantidade à Normandia, mas não tinha nenhuma doutrina militar para desempenho do papel destes nas sebes. Em tempos de paz, o exército teria lidado com o problema estabelecendo comissões e conselhos técnicos, realizando manobras experimentais, testando idéias, antes de criar um manual de preceitos de combate. Mas, na Normandia, o tempo era um luxo de que o exército não dispunha. Portanto, enquanto a infantaria avançava em Contentin, depois de lançar ataques frontais às zonas mortais do domínio inimigo, os tanques começavam a experimentar meios de utilização de suas armas nas sebes.
Fonte: Soldados Cidadãos - Stephen E. Ambrose - Bertrand Brasil
Soldados de infantaria americanos avançam rapidamente entre as sebes (cercas vivas) na região da Normandia. Esta imagem mostra que os soldados se aproveitavam da vegetação para proteção e cobertura de seus deslocamentos. Nessa região das sebes os alemães se tornaram hábeis em transformar cada campo numa pontencial região de emboscada.
ResponderExcluir(Junho/Julho de 1944)
A estrutura e a disposição das sebes na normandia foram particularmente desfavoráveis aos atacantes.
Um líder de esquadrão deveria conseguir três coisas: ver, disparar, manobrar. Mas em uma ofensiva durante a Batalha do Bocage, os atacantes raramente podiam enxergar através dos contatos e sebes. E cada sebe podia muito bem esconder unidades inimigas prontas para uma emboscada. As sebes eram muitas vezes obstáculos intransponíveis que impediam os movimentos dos esquadrões e dos grupos de batalha. O avanço era difícil, tenso e lento.
Em contrapartida, soldados em posições defensivas estavam em posição de força se tivessem tomado as devidas providências para aproveitar as características do terrono. Os alemães conheciam a área da Normandia, na medida em a estavam ocupando há quase quatro anos. Os soldados, bem como os tanques, aprenderam a tirar partido do terreno, além de camuflarem bem suas posições. Por um lado, os alemães inundaram uma grande porção de terra ao Sul e Sudoeste da Baía de Veys, buscando cuidadosamente evitar tocar nas cercas que formavam um bloqueio natural ao avanço Aliado. Apenas as sebes perto de pontos de apoio fixos foram cortadas por razões óbvias de observação e capacidade de abrir fogo.