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domingo, 5 de setembro de 2010

"A Gata"








Em 1939, num povoado do sul da Argélia, vivia uma mulher de 30 anos, chamada Micheline Mathilde Carré. Era casada com um oficial do exército francês.


Ao estalar a guerra, Micheline Carré viajou imediatamente para a França, alistando-se no Corpo de Enfermeiras. Em Paris, durante o período de treinamento, foi considerada, por seus superiores, como uma mulher responsável e eficiente. Depois, quando a França foi derrotada, Micheline Carré se sentiu "terrivelmente comovida", segundo escreveu em seu diário. Antes da chegada das tropas alemães, Micheline Carré transferiu-se para Toulouse e ali, por sua própria iniciativa, organizou um centro de assistência aos feridos. Entretanto, enquanto se dedicava a esta tarefa, conheceu um oficial polonês que atuava no exército francês. Chamava-se Roman Czernianski, e ela, ante a dificuldade de pronunciar-lhe o nome, chamava-o "Armand". Ele, por sua vez, começou a chamá-la "A Gata". As relações de Armand e "A Gata" foram além de uma simples relação sentimental. O ex-oficial polonês, ardoroso combatente, arquitetou um plano para estabelecer um grupo de resistência. "A Gata", sem vacilar, uniu-se a ele.

Armand, não se atrevendo a viajar livremente, com medo de ser reconhecido e detido, confiou essa tarefa à mulher que o acompanhava. Micheline Carré começou, imediatamente, a recrutar os elementos que fariam parte do grupo. Assim, passo a passo, "A Gata" foi estabelecendo as bases do que chegaria a ser um dos grupos mais numerosos e organizados da Resistência. Entre outros, ingressou na organização o coronel francês Marcel Achard. Este, através da Espanha e de Portugal, mantinha estreito contato com os elementos britânicos.

Uma das primeiras tarefas de importância que o grupo empreendeu foi investigar se os alemães permaneceriam na fronteira da Espanha ou avançariam através do território espanhol para atacar Gibraltar. Achard, sem vacilar, encarregou "A Gata" desta investigação.

Micheline Mathilde Carré
A espiã partiu imediatamente para Bordéus e dali passou a Bayon e Biarritz, no sul da França. Ali, perto da fronteira franco-espanhola, estava acampada uma unidade blindada alemã. "A Gata" estabeleceu relação com um oficial alemão...


Foi esta a sua primeira grande missão. Pouco depois, o grupo de Achard era conhecido no serviço secreto britânico e também no americano. Seus agentes eram respeitados e considerados eficazes e valorosos. Neste período, Achard e os britânicos puseram-se de acordo com respeito aos lugares que utilizariam para o lançamento de armas e explosivos, assim como aparelhos de rádio. Além disso, ficou combinado um meio de facilitar a fuga de prisioneiros aliados, que eram conduzidos à Suíça ou à Espanha e, dali, à Inglaterra.

Mais tarde, Armand permitiu que outra mulher ingressasse na organização: Renée Borni. O ingresso da mesma coincidiu com uma mudança nas atitudes da "Gata". Esta, efetivamente, havia descoberto que Armand interessava-se mais do que o normal pela mulher. "A Gata" insistiu, várias vezes, para que a nova integrante do grupo fosse enviada para longe dali. Armand, porém, não o fez. Isso seria o fim. Porque Renée Borni, aliás Violette, destruiria a Resistência. No decurso de uma de suas missões, Violette travou relação com um soldado alemão, sem pressentir que um homem, civil, escutara o diálogo. O desconhecido, um agente da contra-espionagem alemã, suspeitou daquela mulher e a seguiu. E foi assim que conseguiu vê-la em companhia de Armand e da "Gata".

Em 18 de novembro de 1941, Armand e Violette foram aprisionados. Horas depois, Micheline Carré, "A Gata", tinha o mesmo destino.

O que se seguiu é baseado, em parte, em suposições. Conduzida por um sargento alemão a uma casa solitária, sede da contra-espionagem alemã, foi longamente interrogada. Não foi torturada. Porém, "A Gata" cedeu. Inexplicavelmente, a corajosa mulher, que tantas vezes havia desafiado a morte, delatou seus companheiros.

No dia seguinte, "A Gata" saiu acompanhada pelo sargento alemão, que parecia chamar-se Hugo Bleicher. Nas oito horas seguintes, 35 membros do grupo caíram nas mãos da Gestapo. Somente um homem não foi atraiçoado pela "Gata": o Coronel Achard. Durante o julgamento que se seguiu, depois da guerra, o coronel declarou: "Ela sabia onde eu me ocultava, mas não o disse...".

Em 1949, finalmente, "A Gata" enfrentou seus juízes. A acusação, em sua alocução, disse: "Durante dois meses, ela praticou a pior espécie de traição. Seu diário, do qual foi lido uma parte, a descreve como ela é: um cérebro sem coração. Vocês terão que julgar tudo isto. E reconhecerão que há somente uma pena possível: a morte".

O advogado de defesa respondeu: "Admito sua culpabilidade, mas vocês devem considerar que esta mulher teve que escolher entre a vida ou a morte. Não esqueçam que no início da Resistência ela foi uma heroína. Vocês condenariam à morte quem, no começo, implantou a semente da fé e, mais tarde, subestimou sua própria força?"

Em 8 de junho de 1949 foi pronunciado o veredicto: "Micheline Mathilde Carré, de 40 anos, é, pela presente, condenada à morte pela Décima Quarta Corte Criminal".

Poucos meses depois, o presidente da República francesa comutou a pena de morte imposta a Micheline Carré pela de prisão perpétua.

Fonte: http://adluna.sites.uol.com.br/400/499-09.htm

quinta-feira, 26 de agosto de 2010

O Caso Sorge

Um selo com a foto de Richard Sorge



Em janeiro de 1965, informações periódicas, que passaram inteiramente despercebidas, comunicavam à opinião pública que as autoridades russas haviam condecorado três integrantes do grupo de espionagem de Richard Sorge. Era a primeira publicação que reconhecia na Rússia, oficialmente, a existência do célebre personagem.

Richard Sorge, o mais assombroso espião de todos os tempos, nasceu em Baku, Rússia, em 4 de outubro de 1895. Filho de um alemão e de uma russa, educou-se na Alemanha e foi, culturalmente, um alemão.

Sorge tomou parte na Primeira Guerra Mundial, sendo ferido várias vezes. O contato com a guerra e o pós-guerra o levaram ao comunismo, no qual ingressou em 1919, em Hamburgo. Em 1924 foi enviado à Rússia, país em que permaneceu até 1927, quando partiu para a Inglaterra. Ali, então, começou sua carreira de espião a serviço da União Soa:ótica. Os agentes russos, nesta época, eram recrutados entre os militantes dos grupos partidários de cada país. Sorge, imediatamente, propôs uma mudança total no sistema, propiciando o recrutamento de indivíduos alheios à organização partidária. O departamento militar russo que se encarregava da espionagem, o chamado IV Bureau, foi informado da intenção de Sorge e, imediatamente, aceitou-a. O nome Sorge, lentamente, começava a ser conhecido nos mais íntimos círculos da espionagem soviética.

Em 1930, Richard Sorge chegou a Xangai, como representante da revista Soziologisches Magazine, mas sua verdadeira missão consistia em organizar uma rede de espiões e exercer sua direção. Devemos destacar os três princípios fundamentais sobre os quais Sorge exerceu suas atividades: 1) No grupo não devia haver nenhum russo; 2) Os integrantes do grupo não deviam manter contato com o comunismo local, e 3) Os membros do grupo não deviam conhecer-se.

Em 1932, Sorge foi para Moscou e ali recebeu ordens para organizar uma nova rede de espionagem. A tática soviética de organizar vários grupos de espionagem - independentes e destinados a sobreviver à perseguição dos serviços de contra-espionagem - despontava. Em 1933, Sorge viajou a Berlim, onde desempenhou, sob disfarce, suas atividades. Na Alemanha foi nomeado correspondente, em Tóquio, do Frankfurter Zeitung, do German Kurier, da Teknische Rundschau e do Armsterdam Handelsblatt. Paralelamente, filiou-se ao Partido Socialista Nacional, que acabava de ascender ao poder. Misteriosamente, Sorge ingressou no partido nazista e sobreviveu a numerosas "limpas" de elementos indesejáveis. Há somente uma explicação lógica: a esquivança do espião russo, que, dessa maneira, passara despercebido. Por fim, Sorge partiu para o Japão, via Estados Unidos e Canadá. Chegou finalmente a Iocoama, em 6 de setembro de 1933, e, imediatamente, relacionou-se estreitamente com a colônia alemã e seu representante diplomático. Sua "lealdade" à Alemanha e ao regime lhe valeu, em 1939, a nomeação de adido de imprensa da embaixada alemã... Depois de sua chegada a Tóquio, Sorge começou a organizar o grupo de espionagem que trabalharia sob suas ordens. Foram então recrutados Branko Vukelich, jornalista iugoslavo que vivia em Paris; Yotocu Miyagi, um nativo de Okinawa, radicado na Califórnia, e outros mais. O círculo fundamental ao redor do qual girava Sorge e sua organização estava integrado dos mesmos e mais quatro pessoas: Ozaki, Vukelich, Stein e Klausen. Sorge tratava, habitualmente, com todos eles, mas, em linhas gerais, sua relação era maior com Ozaki, Vukelich e Miyagi. Cada um dos integrantes básicos do grupo tinha, por sua vez, seu próprio círculo.

Sorge, depois de lançar as bases da organização, começou a fortalecê-la com uma sólida infra-estrutura; organizou, paulatinamente, seu sistema de agentes, comunicações e correios. Finalmente, com a maquinaria perfeitamente ajustada, o grupo Sorge pôs-se em marcha. Entre 1933 e 1941, o grupo mandou à Rússia uma prodigiosa informação. Em 1939, Sorge informou à União Soviética que a Alemanha havia proposto uma aliança militar dirigida contra ela, mas que o exército e a marinha do Japão se opuseram. A União Soviética, ao ser informada do rechaço japonês à proposta alemã, conseguiu finalmente firmar um pacto com Hitler, que garantiu aos soviéticos a fronteira do leste e determinou a desaparição da Polônia.

Richard Sorge
O ano crucial de Sorge e seu grupo foi 1941. Em abril deste ano, Sorge informou a seus superiores que a Alemanha atacaria a Rússia em maio. Pouco depois, declarou que o ataque seria em 20 de junho (a invasão começou efetivamente, em 21 de junho de 1941). Estava para acontecer um fato que seria vital para a Rússia: a intervenção do Japão no conflito. Isto era particularmente importante, pois, se não houvesse esta intervenção, as forças russas no Extremo Oriente poderiam ser transladadas para a frente européia. A informação foi irradiada, finalmente, por Sorge: o Japão não atacaria a Rússia...

Os espiões, até este momento, operavam livremente, parecendo que não seriam descobertos. As operações eram realizadas com precauções extremas. Porém, um dirigente comunista japonês os entregou à polícia em 1944. Detido. Ito Ritsu informou à polícia japonesa que uma mulher, sua conhecida, era membro do Partido Comunista. A polícia localizou imediatamente a mulher citada e a deteve; ela, então, confessou suas relações com outros comunistas. Várias prisões foram feitas rapidamente. Miyagi foi detido em 10 de outubro; Aquiyama e Cuzumi, no dia 13; Ozaki, no dia 15, e, finalmente, no dia 18, foram presos Sorge, Klausen e Vukelich. Trinta e cinco pessoas implicadas caíram em poder da justiça japonesa.

Finalmente, apesar da reputação de severidade dos tribunais japoneses, apenas 19 pessoas foram sentenciadas; somente duas foram condenadas à morte: Sorge e Ozaki, que foram enforcados em 7 de novembro de 1944. Assim terminou a vida de Richard Sorge, talvez o mais famoso dos espiões russos.

Fonte: http://adluna.sites.uol.com.br/400/499-09.htm

quarta-feira, 25 de agosto de 2010

Abwehr - Os bastidores da espionagem



Abwehr

A guerra, como fenômeno doloroso mas inevitável, mostra duas faces diametralmente opostas: a pública, difundida pelas crônicas periódicas, e a oculta, somente conhecida por grupos selecionados de combatentes e, às vezes, por um só homem. A primeira compreende a ação a céu aberto, a luta de homens e máquinas, o bombardeio, o duelo aéreo e o assalto à baioneta; a segunda vive e se desenrola nas sombras, num silêncio só interrompido quando um homem, ou mais, cai numa ruela silenciosa, baleado na escuridão. Nesse mundo de silêncio é onde a guerra atinge o máximo de dramatismo, um dramatismo que supera o duelo aéreo ou o assalto à baioneta. Nesse mundo, os combatentes jogam sua vida numa cartada, sem nenhuma recompensa, tendo como cúmplices, apenas, um silêncio e uma obscura solidão. Nesse mundo não existem medalhas nem menções. É o mundo da espionagem.

A literatura de ficção tem familiarizado o homem moderno com a figura do espião. E o tem feito alterando fundamentalmente a verdade. A novela e o cinema têm transformado o espião num ser impassível, provido de nervos de aço e dotado de particularidades incomuns. E é aí que a verdade é alterada. Porque o espião não é senão um ser humano, com suas paixões e fraquezas. E também com seus temores, que convertem sua vida diária num longo sofrimento, que termina, invariavelmente, na morte.

O espião, no contexto de uma conflagração mundial, deve ser aceito como mais um combatente; um combatente sem a proteção das convenções e dos tratados internacionais. Para ele não há quartel nem piedade. E assim, como mais um soldado, deve ser estudado em sua trajetória e seus métodos de luta, em sua vida e sua morte, despojado das falsas auréolas de romantismo e das pejorativas definições.


O que é um espião?

Poderíamos definir o espião dizendo que é um homem, ou uma mulher, que vende ou cede informações de importância vital para um Estado. A definição, porém, seria inexata. Com efeito, a informação geralmente é obtida através de pequenos detalhes aparentemente sem importância; porém, esses dados, agrupados e complementados com muitos outros, podem chegar a configurar uma informação de máxima importância. Além disso, vender ou ceder informações implica em considerações e conseqüências diametralmente opostas. Devemos destacar que o Abwehr (Serviço de Informação alemão), em sua seção de espionagem, selecionava, especialmente, voluntários que colaboravam espontaneamente, por simpatia ou por convicções políticas; os espiões mercenários constituíam somente um reduzido grupo, pois o comando alemão achava que o melhor serviço de informação não pode ser comprado.



Como é um espião?

A literatura especializada e a arte cinematográfica têm apresentado o espião, quase sempre, como um personagem de valor infinito, que vive deslumbrantes aventuras, em hotéis luxuosos e automóveis esporte, valendo-se simplesmente de seu valor e de sua força física. Porém, a realidade não é esta.

Um espião é, sempre, um homem ou uma mulher que reúnem, invariavelmente, um valor pessoal e uma série de qualidades individuais indispensáveis ao desempenho de sua tarefa. Quais são? Primeiro, o espião deve possuir uma extraordinária memória. A mesma, inata em muitos seres humanos, pode ser encontrada em muitos outros, atingindo limites inimagináveis. Os métodos e as chaves mnemotécnicas têm especial importância. De qualquer maneira, um espião deverá estar em condições de ler duas, três ou quatro páginas de termos técnicos e repeti-los sem erros nem vacilações. Deverá, ainda, ver um rosto humano e não esquecê-lo nunca mais; para isso, aprenderá a reter em sua memória certos traços determinados, invariáveis e impossíveis de dissimular ou ocultar, e nunca o rosto em sua totalidade. Deverá, finalmente, estar em condições de receber complicadas instruções verbais e recordá-las minuciosamente. Em segundo lugar, deverá conhecer vários idiomas, além do seu. Deparará, em muitas ocasiões, com documentos que estarão redigidos em outro idioma, ou seres que falarão uma língua que pode ser-lhe estranha. Deve estar em condições de entender esta língua, ainda que não totalmente. Um profundo conhecimento de psicologia será imprescindível a um espião, pois o ajudará a prever reações alheias, o porá em guarda e evitará, inclusive, que dê passos em falso. Deverá conhecer muito bem sua zona de operações: ruas, hotéis edifícios públicos, transportes e costumes locais, expressões idiomáticas, etc. O espião deverá estar em condições de responder sem vacilar a um pedido de informação de qualquer desconhecido que o aborde em plena rua, desconhecido este que pode ser, neste caso, um agente da contra-espionagem. Deverá ser, finalmente, um ator consumado, capaz de demonstrar surpresa, dor ou alegria, segundo as circunstâncias o exijam, dominando suas emoções e aprendendo a viver em plena simulação. É necessário destacar uma qualidade que está intimamente ligada à sua profissão: o valor. O espião sabe que para ele não existem convenções internacionais nem piedade. Sabe que sua vida está por um fio. E sabe, principalmente, que ninguém, nem o governo para quem trabalha, dará um passo em seu favor. Ele sabe que está só e isto constitui seu verdadeiro drama.

Almirante Canaris, comandante do Abwehr


Espiões alemães

Em 31 de agosto de 1939, os comandos alemães viviam a excitação do momento histórico que começavam a protagonizar. Somente um alto chefe permanecera despachando em Berlim. Era Wilhelm Canaris, o homem que mais dera de si e de seus homens, até este momento, para o êxito da empresa que a Alemanha estava prestes a empreender. Seus agentes já haviam feito sua guerra, uma guerra silenciosa, subterrânea e sutil, secreta e angustiosa: a guerra da espionagem.

Quem era Canaris? Para alguns, o maior agente alemão de todos os tempos; para outros, um simples intrigante...

Canaris nasceu em Aplerbeck, perto de Dortmund, no coração do Ruhr, em 1o de janeiro de 1887, e era o mais novo dos três filhos de um engenheiro do lugar. Na Primeira Guerra Mundial serviu no Serviço de Informação, esteve no comando de um submarino e no fim do luta passou a comandar o cruzador Schlesien. Depois de desempenhar várias funções no frota alemã, em 1o de janeiro de 1935, surpreendentemente, substituiu o Capitão Konrad Potzig no chefia do Abwehr, Em 1o de setembro de 1939, ao estalar a Segunda Guerra Mundial, Canaris tinha sob seu comando cinco seções: a Seção Central, sob o comando do Coronel Hans Oster, oficial que se destacaria mais tarde como ferrenho antinazista; a Seção Estrangeira, sob o comando do Capitão Buerkner, que mantinha relações com as potências estrangeiras; a Seção II, sob o comando do Coronel von Lohousen, que era responsável pelas ações de sabotagem e outras operações secretas; a Seção III, encarregada dos serviços de segurança, contra-espionagem e contra-sabotagem, e a Seção I, que merece ser estudada detalhadamente.

A Seção I tinha a seu cargo a informação secreta originada da espionagem. Estava organizada em três subseções, pertencentes ao exército, à frota e à aviação, e, além destas, havia cinco grupos. Entre estes, o Grupo I-G, que destinava-se à criação de armas secretas, microfotografias, tintas secretas, etc.; era ali onde se falsificavam passaportes e todo tipo de documentos indispensáveis para o funcionamento da rede de espiões e sabotadores. O Grupo I-I cuidava das telecomunicações, incluindo a fabricação de equipamentos clandestinos de rádio para os agentes, e da organização de redes secretas de rádio. A Seção I, no quartel-general de Berlim, estava instalada num edifício de cinco andares e contava com pessoal relativamente reduzido. Fora dali, ao contrário, seu pessoal era numerosíssimo e integrava a rede de "homens V" (V de "Vetrauen", confiança). Na sua maioria, os homens V eram voluntários a serviço do regime nazista por simpatia ou simplesmente por patriotismo. Havia muito poucos mercenários.

A principal função do Abwehr era defender a Alemanha dos adversários estrangeiros por meio da espionagem agressiva e da contra-espionagem defensiva.

Paralelamente às funções de Canaris e de seus homens, existia na Alemanha outra organização, sob o comando direto de um jovem ex-marinheiro alemão, Reinhard Heydrich. Era o Serviço de Segurança (Sicherheitsdients) para defender a Alemanha dos inimigos internos.

O Serviço de Segurança de Heydrich estava organizado em várias seções. As Seções IV e V eram especializadas em funções policiais. A IV era a temida Gestapo, que operava sob o comando de Heinrich Mueller e destinava-se a combater todos os inimigos do regime. A Seção V era o Kriminolpolizei, ou Kripo, sob o comando de Arthur Nebe.

O Serviço de Informação e o de Espionagem concentravam-se no SD, Seções III (Nacional) e VI (Estrangeira), dirigidas por Reinhard Heydrich. A espionagem agressiva estava a cargo da Seção VI, a famosa Amt Sechs.
A Seção VI desenvolveu-se passo a passo, até converter-se num outro Abwehr no seio da Wehrmacht.

Heydrich, por sua vez, foi reconhecido como um dos mais hábeis chefes do Serviço Secreto de todos os tempos.

As atividades do Abwehr

Hans Pieckenbrock era um alemão de caráter jovial, com um aspecto exterior de comerciante próspero. Porém, sob esta capa simples e sorridente, ocultava-se a verdadeira personalidade de um coronel do Estado-Maior alemão e do chefe da Seção I do Abwehr, dedicada à espionagem. Pieckenbrock, em quem Canaris confiava cegamente, guardava em seus arquivos segredos vitais de várias grandes potências e manejava com pulso firme uma imensa rede de espiões que abarcava dezenas de países. Enfrentava, paralelamente, problemas de toda espécie que se originavam nos serviços repressivos dos citados países e ainda pressões de órgãos alemães. O Ministério de Relações Exteriores alemão, por exemplo, nos anos anteriores à guerra, empenhara-se intensamente em impedir desgastes com a Grã-Bretanha, França e Estados Unidos; isto, logicamente, perturbava profundamente as atividades da espionagem alemã. Em 1937, por ordem expressa de Hitler, o Abwehr organizou, na Inglaterra, uma rede de espionagem de grandes dimensões. Em menos de dois anos, o Abwehr organizou o serviço e completou seus arquivos com detalhes minuciosos acerca da potencialidade do exército inglês e também da RAF e da frota britânica.

Porém, o principal objetivo do Abwehr não era a Inglaterra, e sim a França. Na Seção I foi organizado um ramo especial, com o objetivo de investigar e descobrir tudo sobre as defesas da Linha Maginot. Apesar de haver perdido, nesta empresa, numerosos agentes, o Abwehr obteve, finalmente, a informação precisa dessas defesas. Foi conseguida através de oficiais franceses, comprados pelos agentes do Abwehr; um deles era o Capitão Credle, ajudante do comandante das fortificações do setor de Metz, que forneceu um plano da linha; o outro era o Capitão Forge, encarregado dos abastecimentos na Maginot, que simpatizava com o movimento nazista e cedeu sua informação aos agentes do Abwehr.

Serviço secreto de rádio na OKW(Amt Ausland-Abwehr)
O segundo objetivo importante, para o Abwehr, era a frota de guerra da França. A Seção I-M, divisão de informação naval de Pieckenbrock, reunia os informes que alimentavam uma rede de espiões especialmente adestrados. Um destes últimos era um tenente da marinha francesa, relacionado com uma agente alemã. Este tenente tinha acesso direto ao arquivo e à documentação do Almirante Darlan. Foi assim que a ordem de mobilização chegou ao conhecimento do comando alemão quatro horas antes que às bases e barcos franceses... Outro dos agentes alemães - neste caso, da força aérea francesa - era um capitão da aviação francesa, colaborador de Pierre Cot, Ministro do Ar. Como muitos outros, tornara-se traidor devido a uma agente alemã. Nem todos os espiões alemães, porém, arriscavam suas vidas a troco de dinheiro ou sob a influência de uma mulher mais ou menos atrativa. Como já se havia dito, o serviço de espionagem alemão preferia, acertadamente, aqueles agentes que colaboravam por patriotismo ou simpatia pelo regime. Se déssemos exemplos, teríamos centenas de nomes, mas a descrição minuciosa de somente um deles demonstrará quão árdua e perigosa foi, e é, a missão dos homens que arriscaram, e arriscam, a própria vida pelo amor à pátria.

Num domingo do mês de outubro de 1939, no gabinete do Almirante Karl Doenitz, comandante da frota submarina alemã, o alto chefe dialogava com um jovem oficial, comandante de um submarino. Este último - que não era outro senão o mais tarde famoso Gunther Prien - escutava em silêncio as palavras de seu superior. Doenitz, debruçado sobre um grande mapa de operações, disse: "Tudo depende de um ataque rápido e de surpresa. Scapa Flow tem sete entradas. Se um submarino fosse capaz de penetrar nela, apesar da rápida e traiçoeira corrente... Isto pode ser feito e creio que você é o homem indicado... ".

Almirante Canaris
Em seguida, Doenitz entregou ao Comandante Prien algumas folhas de papel datilografadas, e vários diagramas e mapas. Aquela documentação de valor inapreciável havia sido entregue ao Alto-Comando alemão da frota por um dos melhores agentes alemães que operavam na Grã-Bretanha. O espião, Albert Oertel, havia chegado à Inglaterra em 1927, procedente da Suíça. De acordo com o declarado às autoridades inglesas, era um relojoeiro que desejava radicar-se na Escócia.

Na realidade, aquele relojoeiro suíço não era uma coisa nem outra. Tratava-se, na verdade, de um ex-oficial da marinha alemã, chamado Alfred Wehring, especialmente treinado para espião.

Depois de sua chegada à Grã-Bretanha, Wehring radicou-se definitivamente na cidade de Kirkwall, em Orkneyes, perto de Scapa Flow, a importante base naval.

Oertel - Wehring, na realidade tornou-se um ótimo vizinho dos habitantes do lugar. Era amável, cortês e sumamente inclinado a criar amizade com seus clientes. Porém, no segundo andar de seu pequeno negócio, Oertel ocultava um minúsculo rádio de onda curta, com o qual se comunicava regularmente com o continente; através daquelas mensagens, o serviço de informação alemão tinha observações detalhadas dos movimentos dos barcos ingleses, as particularidades da base e um sem-número de detalhes técnicos que o relojoeiro suíço averiguava por meio de suas inocentes conversações com os oficiais britânicos que chegavam até ele. Paralelamente, era através da correspondência que chegava da Suíça, aparentemente de sua longínqua família, que ele recebia as instruções de seus chefes.

Ao começarem as hostilidades, Oertel recebeu uma carta na qual comunicavam o falecimento de sua velha mãe. Angustiado pela notícia, o relojoeiro apressou-se em viajar ao continente. Dois dias mais tarde, Oertel embarcava em Leith, num barco que se dirigia para Roterdã. Em seu poder, cuidadosamente cosidos no forro de sua jaqueta, levava cartas secretas, diagramas e esboços de Scapa Flow, minuciosamente detalhados. Ao chegar a Roterdã, Oertel dirigiu-se ao Hotel Comércio, onde o esperava Fritz Burler, chefe do serviço de espionagem alemão na Holanda. Juntos, imediatamente dirigiram-se para Haia, onde o Barão von Bulow, importante chefe da espionagem alemã, os esperava. Este, depois de olhar a documentação levada por Oertel, compreendeu que estava de posse de valiosíssima informação, que deveria ser enviada imediatamente ao Almirante Canaris.

Em seguida, depois de cumprir sua missão, Oertel regressou à Inglaterra, decidido a continuar com sua tarefa de informação.

No mês de outubro, Oertel comprovou que as defesas da base possuíam falhas que estavam sendo reparadas urgentemente. Era necessário agir sem vacilação, e assim o fez. Minuciosas e detalhadas investigações permitiram a Oertel comprovar qual era o setor que ainda se encontrava indefeso e exposto à penetração de um barco inimigo.

Na tarde do mês de outubro, quando conseguiu a citada comprovação, Oertel fechou sua loja mais cedo que de costume e subiu rapidamente ao segundo andar. Ali, emitiu pelo rádio a senha convencional e esperou. Depois de estabelecida a comunicação, irradiou sua preciosa informação: "Scapa Flow está indefesa... ".

A mensagem de Oertel chegou ao quartel-general do Almirante Doenitz, da Kriegsmarine. Doenitz compreendeu que um pequeno atraso seria fatal, pois as entradas expostas seriam logo reparadas. O golpe, pois, deveria ser dado imediatamente. Foi quando conversou com o Comandante Prien.

A conseqüência do anteriormente exposto não se fez esperar. Na noite de 13 de outubro de 1939, o submarino alemão U-47 deixou o porto de Kiel. O Capitão Prien, que estava no comando do barco, era o único que sabia do objetivo da missão e suas ordens eram para não revelá-lo, até o último momento.

Ao cruzar as perigosas correntes da entrada da imponente base naval britânica, o U-47 subiu quase até a superfície. Em seguida, o periscópio percorreu minuciosamente a área de Scapa Flow. Atracado junto à costa encontrava-se o Royal Oak. O U-47 acercou-se lentamente de sua presa, até uma distância em que era impossível errar a tiro. Uma breve ordem partiu de Prien: "Fogo!" Depois de alguns segundos deu-se uma explosão terrível. Dois torpedos mais foram disparados ainda contra o Royal Oak.

A cena que se seguiu foi dantesca. Em meio às sombras da noite, as explosões sucediam-se ininterruptamente, destroçando o enorme barco. Entretanto, velozes caça-torpedeiros e lanchas torpedeiras sulcavam as águas, buscando, com seus refletores, o agressor. Prien, porém, com maestria e com uma incrível sorte, conseguiu escapar dali sem nada sofrer. Sem dúvida, esta empresa jamais teria sido realizada se não fosse a decidida e audaz intervenção de Alfred Wehring, o oficial naval alemão que havia adotado a personalidade de Albert Oertel, o pacífico relojoeiro. Depois do episódio, Wehring abandonou silenciosamente seu negócio e desapareceu tão misteriosamente como havia chegado.

O episódio Wehring-Oertel é típico e se repetiu várias vezes, em diferentes lugares e com diversos protagonistas. Em todos, porém, houve um denominador comum de sacrifício: silêncio e tensão insuportáveis para alguém que não possua nervos de aço.


Espionagem americana

No campo aliado, paralelamente, alternativas das mais variadas dificultaram a tarefa dos serviços de informação. Vejamos o Caso Donovan. Em janeiro de 1942, numa entrevista que o então Presidente Roosevelt manteve com William Donovan, o presidente, sem preâmbulos, afirmou que os Estados Unidos careciam de um Serviço de Informação capaz e efetivo. Donovan era o chefe do Bureau Coordenador de Informação, departamento organizado antes do ataque a Pearl Harbor e integrado por várias dezenas de investigadores das mais variadas especialidades. Eisenhower, anos mais tarde, no fim da guerra, expôs uma opinião semelhante, ao dizer: "A Europa estava em guerra há um ano, quando a América alarmava-se ante o estado de suas defesas... O obstáculo maior era... a indiferença. Inclusive quando a França caiu, em maio de 1940, não tínhamos ainda conseguido despertar de nossa inércia... No Departamento de Guerra havia uma surpreendente deficiência que dificultava todos os planos construtivos no campo da informação... A posição de órfã da Seção G-2 em nosso Estado-Maior era comprovada de várias formas. Por exemplo, quase sem exceção, a G-2 esteve sob o comando de um coronel. Isto, em si, não é grave, pois era preferível colocar à frente da seção um coronel capaz do que um general medíocre; mas vê-se claramente que o exército não se dava conta da importância do serviço de informação...".

William Donovan
Porém, devemos destacar que, apesar das opiniões de Eisenhower e Roosevelt, os serviços de informação dos Estados Unidos cumpriam acertadamente suas ordens. Devemos destacar, ainda, o serviço criptográfico do exército e da marinha, que funcionava melhor do que nunca e decifrava as mensagens mais confidenciais do inimigo.


Quando começaram as hostilidades, cada uma das frotas japonesas foi provida de vários sistemas de chaves, cada um dos quais era trocado regularmente. Porém, os criptoanalistas americanos descobriram suficientes senhas, nas telecomunicações japonesas, para ter uma idéia mais ou menos exata das intenções e disposições japonesas. Estas chaves incluíam o volume do tráfego, a repetição de certas letras de chamada, a longitude das mensagens e os tipos de chaves que eram empregados. Todos estes detalhes foram catalogados até que se chegou a uma conclusão muito clara: o Almirante Yamamoto preparava-se para outra ação de grande importância. Para determinar o objetivo de seus preparativos, os japoneses faziam referência ao mesmo com os letras AF e essas duas letras podiam significar muitíssimos lugares: Midway, Havaí, as Aleútas, etc. Nestas circunstâncias, na primavera de 1942, fez-se necessário saber exatamente a que ater-se. Foi então que o Almirante Nimitz pôs em prática uma armadilha que daria o resultado esperado. Nimitz ordenou ao Comandante Cyril Simard, de Midway, que informasse pelo rádio a Pearl Harbor que o abastecimento de água potável do atol fôra interrompido. A mensagem foi transmitida numa linguagem que os japoneses puderam interpretar facilmente.

No terceiro dia aconteceu o esperado. Uma das mensagens japonesas interceptadas dizia que em AF havia dificuldades no abastecimento de água potável.

Yamamoto, indubitavelmente, havia sido derrotado pela criptografia americana. E, mais tarde, haveria de sucumbir nas mãos da mesma. Foi quando o almirante empreendeu a sua última viagem. A notícia da viagem foi interceptada pelos criptoanalistas americanos e foi preparado a armadilha fatal.

Uma nomeação implicaria num notável melhoramento na situação da espionagem americana, em maio de 1942, quando o General Strong foi designado para chefiar a Seção G-2.

Strong foi indicado pelo General George Marshall, levando em conta não somente seus merecimentos em relação às tarefas de informação, mas também sua conhecida decisão e energia indômita.

O primeiro ato de Strong foi partir para Londres para estudar o terreno e o funcionamento dos serviços de inteligência britânicos. Quando voltou, Strong montou nos Estados Unidos uma organização inteiramente nova. Um de seus principais colaboradores foi "Wild Bill" Donovan, sob as ordens do Escritório de Serviços Estratégicos (SSO). Este foi dividido em três ramos paralelos. O primeiro foi o "R e A" (investigação e análise); o segundo era o "MO" (operação Morales), que dirigia a propaganda com o fim de minar a resistência do inimigo e enganá-lo por todos os meios possíveis; a terceira era o "SI" (informação secreta), centro vital da organização, que compreendia o grupo de espiões e sabotadores.

No decorrer da guerra, o SSO empregou mais ou menos 20.000 pessoas. Os integrantes do SSO eram pessoas de todas as classes e níveis sociais e culturais; havia entre eles desde Prêmios Nobel até indivíduos de baixo caráter.

Sob a direção de Donovan, o serviço de inteligência começou a funcionar, afinal, efetivamente. Suas façanhas, ocultas no momento, viriam à luz anos depois, no fim da luta.


Os segredos da espionagem 

O que narramos a seguir ilustra bem os múltiplos e estranhos recursos que a espionagem tem que pôr em prática com o objetivo de obter a informação. "Já fazia bastante tempo que o adido militar da embaixada americana estava conversando com o funcionário russo. Uma série de assuntos haviam sido abordados, e o russo falava sobre o interessante terreno das cifras de produção. O militar americano disse a si mesmo que este era o seu dia de sorte. Conversavam num discreto recanto de um restaurante moscovita e as mesas próximas estavam desocupadas. Ninguém poderia escutá-los. O americano oferecera a seu informante uma boa recompensa em troca de futuros dados. 

"O oficial americano reparou que seu copo estava vazio. Tinha sede e viu que na mesa ao lado, desocupada, havia um martini solitário. Interrompeu o diálogo e foi buscá-lo. Quando estava levando à boca a azeitona do martini, notou que algo estava para acontecer. Um garçom correu até ele, gesticulando e dizendo, atropeladamente: "Um momento... um momento... esta bebida não é para o senhor". 

"Já era tarde. O militar mordera a azeitona e um dos seus dentes estalou ao chocar-se com uma superfície metálica. A azeitona era um minúsculo transmissor de transistores. O palito era a antena. Toda a conversação que acabava de ter com o funcionário russo havia sido captada da mesa vizinha e registrada por um gravador oculto." 

Este fato foi divulgado pela revista americana Time e por várias revistas especializadas em eletrônica, demonstrando até que ponto os métodos de espionagem haviam-se aperfeiçoado, graças ao progresso da ciência. 

A imprensa explorava os casos mais escandalosos da espionagem eletrônica, principalmente os que afetavam as embaixadas de países ocidentais atrás da Cortina de Ferro. Entre eles houve um que se destacou por sua audácia e pela extraordinária perícia técnica posta em prática, dando origem a uma competição entre os Estados Unidos e a União Soviética no campo da eletrônica. Nos referimos ao descobrimento de um minúsculo microfone colocado no escudo dos Estados Unidos, situado atrás da cadeira do embaixador americano na União Soviética. 

Um especialista na matéria, que participou da busca do microfone, declarou, confidencialmente: "Os russos haviam progredido muito nesta arte. Não estávamos equipados para detectar o aparelho, porque os russos haviam instalado, no edifício em frente, um enorme transmissor sintonizado para interferir nas ondas de nossos detectores, quando estes aproximavam-se da cavidade do microfone; esse transmissor funcionava num espectro de freqüência ultra-elevada, que não estávamos em condições de captar". 

Para descobrir este microfone foi necessário demolir o escritório do diplomata, e talvez nunca os americanos houvessem suspeitado de sua existência se os ingleses não houvessem percebido em sua própria embaixada um sinal de rádio que não puderam identificar. 

Espionagem fotográfica 

Em meados de junho de 1942, o Serviço de Informações da Marinha italiana comemorava a aquisição de um dado de capital importância com respeito aos comboios britânicos e à proteção dos barcos de guerra. Tanto uns como outros estavam protegidos por redes de defesa contra torpedos. A informação, de grande importância, não havia sido obtida pelos clássicos meios da espionagem. Nenhum espião poderia proporcionar a rigorosa exatidão e o preciso realismo da imensa ampliação fotográfica, em cores, que se estendia ante os olhos dos oficiais italianos. 

O progresso técnico das últimos décadas abria novas possibilidades aos antigos métodos de espionagem (clandestinidade, risco e intriga), com o acervo de outros métodos de informação, mais seguros e diretos: a fotografia aérea, a interceptação de mensagens radiotelegráficas e, mais tarde, o radar. 

Os alemães, possuidores de uma tradição na indústria de instrumentos de precisão, dispunham, nessa época, de meios mais avançados para a obtenção de fotografias aéreas. 

A Luftwaffe atacava silenciosamente, acionando o disparador de suas poderosos câmaras, ao mesmo tempo que abria as escotilhas das bombas. Foi a Luftwaffe que, ao chegar ao Mediterrâneo, começou a prover a marinha italiana de fotografias aéreas das bases navais e das formações inimigas. 

Dia a dia, os posições da frota britânica eram fotografados e estudadas comodamente, graças às gigantescas ampliações, em cores, que eram recortadas e preparadas de tal maneira que, ao serem observadas através de lentes especiais, ofereciam uma visão panorâmica, estereoscópica e tridimensional. 

Assim, antes de lançar-se ao ataque contra os encouraçados de Alexandria, a marinha italiana conhecia com precisão todos os pormenores da rota a seguir e estava em condições de averiguar todas as variações que se produzissem na mesma, eventualmente.

Fonte: http://adluna.sites.uol.com.br/400/499-09.htm


segunda-feira, 7 de junho de 2010

Espionagem em Pearl Harbor



Tudo começou em 1935 e o cenário foi o Ministério de Propaganda do III Reich, em Berlim. Fazia dois anos que Goebbels estava à frente daquele departamento quando, em princípios deste ano, ofereceu uma festa ao seu pessoal. O secretário particular do ministro de propaganda, Leopold Kuehn, estava presente, acompanhado por sua jovem irmã Ruth. Goebbels, geralmente indiferente à beleza feminina, sentiu-se atraído pela formosa Ruth. Ficou toda a noite a seu lado e, de acordo com as aparências, aquele encontro tornaria a se repetir. Porém, mais tarde, possivelmente sob pressões, Ruth Kuehn teve que sair da Alemanha. O destino quis que sua nova residência fosse fixada próxima à do General Haushofer, famoso geopolítico. O general informou a Goebbels que tinha oportunidades não somente para a senhorita Kuehn, mas também para seus pais e irmãos. Aquelas "oportunidades" significavam ingressar, depois de um período de treinamento, no Serviço Secreto do Japão; devemos destacar, com efeito, que Haushofer trabalhava na organização do citado Serviço Secreto a pedido do governo japonês.

Em 15 de agosto de 1935, finalmente, uma família alemã desembarcou no Havaí. O pai era cientista, um elegante professor de cabelos grisalhos, bem educado de aspecto atraente. O Doutor Bernard Julius Otto Kuehn chegou com toda a sua família, exceto seu filho Leopold. Com ele vieram sua esposa Friedel, seu filho de seis anos, Hans Joachim, e sua filha Ruth. Estavam ali porque seu pai interessava-se pelo idioma japonês. Além disso, o doutor e sua filha estavam cativados pela história do Havaí. Eles percorreram meticulosamente todo o Havaí, até conhecer a topografia de suas ilhas melhor que sua própria casa. Ruth gostava da praia e dos esportes aquáticos, assim como sua família. Freqüentemente nadavam e passeavam de lancha. Friedel, a mãe, cujo aspecto era de uma matrona vulgar, escutava e observava detalhes de importância que passariam despercebidos a olhos menos avisados.

Ruth trabalhava de acordo com o plano estabelecido. Falava corretamente o inglês, dançava maravilhosamente e freqüentava todas as reuniões sociais importantes, onde se encontrava com oficiais americanos desejosos de passar uns momentos com a formosa alemã.

O doutor, por sua vez, escrevia uma série de artigos sobre os primeiros colonos alemães que chegaram às ilhas; os artigos, aparentemente, eram publicados por jornais de seu país natal.

Durante seus primeiros três anos nas ilhas, receberam cerca de 70.000 dólares, enviados a um banco de Honolulu pela Rotterdam Bank Association. Friedel, por seu turno, voltou de uma de suas viagens ao Japão com mais de 16.000 dólares.

Posteriormente, o FBI e o Serviço Secreto da Marinha calcularam que a família recebera, durante aquele período, quase 100.000 dólares.

Os Kuehn, porém, estavam a serviço de dois países. Cedidos aos japoneses pelo General Haushofer, os alemães descobriram logo seu valor. E foi assim que cópias das informações partiram rumo a Berlim, engrossando os arquivos da espionagem alemã.

No começo do ano de 1939, o Doutor Kuehn decidiu que necessitava de um lugar tranqüilo para o estudo do idioma japonês. Mudou-se, então, com sua família, de Honolulu para Pearl Harbor. A partir de então, o plano do Serviço Secreto japonês, para o qual haviam sido enviados Ruth e seu pai, começou a concretizar-se.

Ruth converteu-se na companhia favorita dos jovens e das esposas dos oficiais de marinha. Muito atraente, deu a entender, de muitas maneiras, ser uma experta no cuidado da beleza física. Por isso, quando em 1939 decidiu abrir um salão de beleza, a idéia foi recebida com entusiasmo. O êxito foi total, e a concorrência, integrada na maioria por noivas ou esposas de oficiais navais, superou todas as expectativas. Não é preciso dizer que as informações recolhidas referentes a chegadas e partidas de barcos, avarias, acidentes e alarmas iam diretamente para seus objetivos: Berlim e Tóquio. Afinal, o vice-cônsul japonês em Honolulu, Otogiro Okuda, reuniu-se secretamente com Ruth e seu pai. Okuda disse-lhes que era necessário enviar informações precisas, detalhadas e minuciosas, com dados exatos, das localizações dos barcos, aeroportos e quanta informação militar pudesse ser recolhida, com brevidade.

Kuehn começou a dar cumprimento ás instruções recebidas, iniciando longos passeios pelos molhes de Pearl Harbor, acompanhado de seu filho pequeno, excelente pretexto para deter-se ante os imponentes couraçados e estudá-los detidamente.

Os Kuehn, além da residência em Pearl Harbor, tinham uma pequena casa em Kalama, povoado situado em Oahu, perto de Pearl Harbor. Dali, pai e filha, em 2 de dezembro de 1941, utilizaram um sistema de comunicações por meio de sinais luminosos, que se constituiu em pleno êxito. Além disso, providos de poderosos binóculos, estudavam detidamente os movimentos dos barcos americanos. Os sinais, em código, eram recebidos pelo Vice-Cônsul Okuda, que, depois de decifra-los, os irradiava imediatamente a Tóquio.

Em 7 de dezembro de 1941, Ruth Kuehn abriu a janela da água-furtada e seu pai começou a fazer os sinais convencionais. Por meio destes, informaram aos japoneses quais eram os objetivos que deviam atacar e suas localizações. O Doutor Kuehn indicava os alvos, enquanto Ruth os observava por meio de seus binóculos.

Daquela pequena janela foi conduzido o ataque a Pearl Harbor, na manhã de 9 de dezembro.

Mas algo sucedeu. Aquelas luzes, quase imperceptíveis, foram localizadas pelos homens da defesa. E os Kuehn, que esperavam sair de Pearl Harbor num submarino japonês, foram detidos. O Doutor Kuehn, desesperado, atribuiu a si toda a responsabilidade do feito. Procurou por todos os meios evitar as suspeitas que recaíam sobre sua esposa e sua filha e, finalmente, resolveu revelar tudo quanto sabia. Kuehn foi condenado à morte; mais tarde, em 26 de outubro de 1942, a sentença foi comutada por 50 anos de trabalhos forçados, que seriam cumpridos em Alcatraz. Sua esposa e sua filha Ruth foram presas e, posteriormente, libertadas.

Fonte: adluna.sites.uol.com.br/

sexta-feira, 7 de maio de 2010

Nordpol: o maior blefe da guerra secreta

Introdução:
Abwehr, nome do serviço de informação do exército alemão, ativo de 1925 a 1944. O líder da Abwehr chamava-se Wilheim Canaris e ocupava o posto de almirante. Reportava diretamente ao OKW (Oberkommando der Wehrmacht), alto comando das forças armadas alemãs. O termo Abwehr significa defesa.

Serviço secreto de rádio na OKW(Amt Ausland/Abwehr)

H. J. Giskes

Como o serviço secreto do Exército Alemão lubridiou os aliados através de suas redes de contatos subterrâneos na Holanda :

Em dezembro de 1943, os Aliados tinham uma esmerada rede de espionagem e uma organização subterrânea de cerca de 1.500 sabotadores que agiam na Holanda ocupada pelos alemães ou assim acreditavam eles. Na realidade, os rádios "subterrâneos" que respondiam aos chamados de Londres estavam nas mãos de operadores alemães há quase dois anos. Os homens e a enorme quantidade de armas e explosivos que o Serviço Secreto anglo-holandês lançara de pára-quedas na Holanda, em quase 200 operações, foram todos esperados, ao chegar, por comissões de recepção alemãs. Cinqüenta e quatro agentes secretos treinados em Londres estavam na prisão, enquanto os contra-espiões alemães inventavam histórias fabulosas sobre as atividades deles e as transmitiam para a Inglaterra. Foi uma das mais gigantescas mistificações perpetradas contra os Aliados em toda a "guerra secreta".

Na qualidade de major do Abwehr (serviço secreto do Exército Alemão), recebi ordem de apresentar-me em Haia, no outono de 1941, para assumir o comando da contra-espionagem militar nos Países Baixos. Tinham corrido boatos de comunicações radiofônicas clandestinas com Londres. Nossa função era descobrir os agentes inimigos e invalidar seus planos de levarem a guerra à retaguarda das linhas alemãs.

Nosso primeiro golpe de sorte ocorreu em fins de novembro. Um de nossos agentes secretos, que conseguira introduzir-se na resistência holandesa, informou que estava sendo organizada em Haia, por dois agentes britânicos, uma nova rede de espionagem. Tal informação foi confirmada em janeiro de 1942, quando o Tenente Heinrichs, do nosso serviço de escuta, ouviu um novo transmissor, com prefixo RLS, operando em Haia.

Começamos a controlar a RLS, anotando todos os detalhes da técnica de transmissão. Nosso objetivo não era eliminar a estação, e sim utilizá-la, isto é, operá-la nós mesmos, fingindo-nos de agentes aliados. Isso nos faria conhecer por dentro as operações do serviço secreto inimigo.

Em 6 de março, o nosso radiogoniômetro indicou a situação exata da RLS e na mesma noite nós prendemos o seu operador - um inglês, H. M. G. Lauwers. Dentro de algumas horas havíamos prendido todos os colaboradores do grupo de espionagem, de maneira a não deixar elementos que pusessem em perigo a nossa mistificação.

Com os códigos apreendidos no momento da prisão e outras informações fornecidas pelo nosso agente no grupo de espionagem, não tardamos a desvendar o código secreto de Lauwers. Mas Lauwers recusou-se a transmitir as nossas mensagens falsas para Londres, e nós relutávamos em fazê-lo nós mesmos - por enquanto.

No terceiro domingo de março, procurei Lauwers e disse-lhe que só ele poderia facilitar o meu plano de salvá-lo e ao agente Thijs, seu colega, de condenação à morte por um tribunal militar alemão. Disse-lhe que teria apenas de transmitir as três mensagens que não pudera mandar no dia da sua prisão.

Lauwers mostrou-se interessado, mas conservou-se em silêncio. Modifiquei minha maneira de tratá-lo.

- Como soldado, respeito sua coragem e seu senso de dever - disse eu - mas deploro a missão que Londres lhe confiou, pois importa em armar civis para que nos alvejem pelas costas. Todo exército de ocupação é obrigado a sufocar tramas dessa espécie com a captura de reféns. Usarei, portanto, de todos os meios ao meu alcance para impedir o fornecimento de armas a fanáticos desse país, pois o uso delas só poderá resultar num banho de sangue para a população holandesa.

Vesti o sobretudo.

- Está na hora de se preparar a transmissão de hoje - disse eu - você vem?

Ele me olhou dentro dos olhos e respondeu:

- Vou.

Lauwers irradiou as três mensagens e depois recebeu vários despachos referentes a irradiações anteriores da RLS. Heinrichs, naturalmente, tinha um de seus agentes ouvindo a transmissão na chave de um aparelho de interferência, para o caso de Lauwers nos trair. Nada de suspeito ocorreu (1).

E assim começou o que denominamos "Operação Nordpol" (Pólo Norte).

Por quanto tempo seria possível manter essa comunicação radiofônica com Londres? Se houvesse no código sinais que desconhecíamos para confirmar a autenticidade do operador, a mistificação poderia muito bem ser descoberta na transmissão seguinte.

Na segunda vez que estivemos no ar, Londres fez um apelo urgente: preparação de uma zona onde pudesse ser lançada grande quantidade de material de sabotagem e um novo agente. A notícia perturbou Lauwers consideravelmente. Disse que não operaria mais a RLS, que não podia tornar-se responsável pela queda de camaradas seus em nossas mãos.

- Esse homem cairá nas nossas mãos, quer você coopere, quer não - disse-lhe eu. - Se você continuar as transmissões para nós, espero obter das autoridades superiores que não sejam condenados à morte os agentes que capturarmos (2).

Lauwers voltou para o transmissor.

O aviso do desembarque foi recebido em 27 de março, e às 11 horas da mesma noite uma pequena caravana de automóveis, com as luzes amortecidas, parou numa pequena mata perto do local onde deveriam cair os pára-quedistas e onde havia três homens com poderosas lanternas de luz vermelha dispostos num grande triângulo. Esperamos duas horas. Teriam os britânicos descoberto o nosso estratagema? Estariam a caminho do nosso triângulo iluminado com uma carga de bombas, para pulverizar-nos no pântano com TNT?

Finalmente ouvimos um ruído de motores e um avião passou por cima de nós a uns 200 metros de altura no máximo. De repente, bem sobre nós, apareceram, na esteira do avião, vários pontos escuros. Quatro pesados volumes, sustidos por pára-quedas, tocaram o solo com baques surdos. Um quinto pára-quedas trazia o agente. O bombardeiro ganhou altura, suas luzes piscaram numa saudação, e ele desapareceu.

Eu e Heinrichs apertamos as mãos em silenciosa congratulação.

Imediatamente após esta operação, radiografamos para Londres informando que o agente lançado de pára-quedas estava bem e em boas mãos. Seguiu-se um calmo intervalo de várias semanas. Isso nos pareceu de mau agouro, pois tínhamos provas de que o serviço secreto anglo-holandês estava realizando operações na Holanda sem o nosso auxílio. Entre outras coisas, ouviu-se um novo transmissor na área de Utrecht e em abril foi encontrado o corpo de um pára-quedista, perto de Holten, com o crânio fraturado; ao aterrar tinha batido com a cabeça numa pedra. Comecei a preocupar-me com nossas transmissões pela RLS. Teria Londres desconfiado?

A verdade é que nossa primeira vitória não poderia ter sido mantida por muito tempo se não fosse o que aconteceu depois: por mero acaso, caíram em nossas mãos todos os canais usados por Londres para controlar o serviço secreto anglo-holandês!

Sem o nosso conhecimento, seis agentes haviam descido aos pares, cada par com um aparelho de rádio. Viemos a saber depois que, nas aterragens, morrera um operador de rádio, de nome Maartens (era seu o corpo encontrado junto à pedra) e que só um aparelho chegara intacto. À vista disso, os agentes se entrosaram, transmitindo seus comunicados por esse único aparelho, que funcionava e respondia pela cifra de Trumpet. Quando Londres deu ordem para que a RLS entrasse em contato com um dos agentes da Trumpet, ficamos conhecendo toda a rede.

A Trumpet caiu em nosso poder completa, com seu plano de, sinalização e seus códigos. Utilizamo-la para iniciar uma segunda linha de comunicação Nordpol com Londres e sugerimos para esse grupo um novo local para o lançamento de pára-quedas. Aceitamos a primeira aterragem nesse ponto cerca de 15 dias depois.

Agente utilizando um aparelho de rádio
Enquanto isso, o plano de sinalização de Maartens, o operador morto, fora encontrado em poder de seu companheiro, Andringa. Anunciamos para Londres, via Trumpet, que Andringa descobrira na resistência um operador de confiança que podia servir-se da sinalização de Maartens com o aparelho deste já consertado. Londres mandou que o novo recruta fizesse uma transmissão de experiência para comprovar sua capacidade. O operador alemão que se submeteu à prova foi rapidamente aceito, e assim estabelecemos uma terceira linha de comunicação com Londres.

Em meados de maio. Heinrichs declarou suspeitar que Lauwers havia transmitido letras adicionais no fim de sua última mensagem. Esperamos ansiosamente para ver se Londres desconfiara de alguma coisa. Parecia que não. Entretanto pusemos termo às transmissões de Lauwers, propondo operadores de "reserva". Com espanto nosso, eles foram aprovados.

À medida que novos agentes iam sendo presos à chegada, nossos homens iam apanhando os transmissores e operando-os. Com isso corríamos o risco de que as características de transmissão de algum agente houvessem sido gravadas em Londres antes da partida. Se assim foi, eles nunca fizeram uma verificação cuidadosa. Em várias ocasiões, durante a Operação Nordpol, chegamos a ter 14 canais de comunicação radiotelegráfica com Londres e isso apenas com seis operadores alemães!

De junho em diante, a operação desenvolveu-se de maneira inacreditável. Os lançamentos de pára-quedas se sucediam quase ininterruptamente. A decisão tomada em Londres de mandar todos os futuros agentes e materiais por intermédio das articulações existentes foi o grande erro do nosso inimigo. Um só grupo de controle lançado às cegas, sem o nosso conhecimento, poderia ter desarticulado a Operação Nordpol.


H. J. Giskes

Em julho, Londres confiou ao grupo da RLS uma tarefa especialmente importante: um reconhecimento para ver se era possível fazer explodirem as torres do transmissor de Kootwijk, pelo qual o Almirantado Alemão se comunicava com os submarinos no Atlântico. O agente Thijs deveria comandar a turma encarregada da demolição. Mandei uma patrulha de reconhecimento e depois radiografei as conclusões exatas a que chegara: a demolição das torres não apresentaria grandes dificuldades; Thijs e seu grupo estavam de prontidão, à espera de ordens para levar a cabo a operação. Quando chegou a ordem, eu já tinha inventado motivos para o "insucesso". Dois dias depois a RLS transmitiu para Londres a seguinte mensagem: "Tentativa contra Kootwijk mal sucedida. Nossos homens encontraram campo de minas. Cinco homens desaparecidos. Thijs e os outros salvos, inclusive dois feridos". No dia seguinte: "Dois dos cinco desaparecidos voltaram. Três outros mortos em combate. Inimigo reforçou guarda de Kootwijk e outras estações".

Londres respondeu: "Lamentamos muito suas perdas. Sistema de defesa novo e imprevisível. Necessária a maior vigilância possível. Comunique qualquer anormalidade". Mandei noticiar o caso na imprensa holandesa. A notícia dizia que elementos criminosos haviam tentado fazer explodir uma estação de rádio. O material de sabotagem apreendido sugeria auxílio do inimigo. Eu esperava que meus adversários em Londres tivessem conhecimento dessa notícia por intermédio dos países neutros. Quinze dias depois, Londres mandava à RLS uma mensagem de congratulações pela tentativa de sabotar Kootwijk. Thijs deveria receber uma condecoração britânica como dirigente da operação.

A fase decisiva da Nordpol, de junho de 1942 até a primavera de 1943, foi a sua participação na Operação Marrow, de iniciativa anglo-holandesa. O chefe da operação Marrow era um agente chamado Jambroes, cuja missão - conforme soubemos quando os representantes da resistência lhe deram as boas-vindas antes de o prendermos - era estabelecer contato com os líderes da organização holandesa Ordedienst e fazer com que esta formasse 16 grupos de sabotagem e resistência com cem homens cada um.
Desenhos de radares alemães feito por agentes.

Não sabíamos quem eram os líderes da Ordedienst, de modo que comunicamos a Londres que havia desmoralização nas altas camadas da organização e que se haviam infiltrado espiões alemães entre os seus dirigentes. Sugerimos que Jambroes entrasse em contato com líderes de organizações de maior confiança.

A formação fictícia da organização Marrow começou em agosto de 1942. Os 16 grupos tiveram um desenvolvimento aparentemente tão grande que, em novembro, Londres havia mandado por nosso intermédio 17 agentes, cinco dos quais eram operadores de rádio, com seus próprios aparelhos e freqüência. Quando radiografamos que havia cerca de 1.500 homens recebendo instrução, lembramo-nos de que toda aquela gente precisaria com urgência de coisas tais como roupas, calçados, fumo, chá. E pedimos abastecimentos, recebendo certa noite uma remessa de cinco toneladas!


(1) Depois da guerra, Lauwers declarou que recebera instruções de Londres para cometer propositadamente um erro na 16ª letra de cada mensagem; a falta dessa "prova de identidade" indicaria que ele tinha caído nas mãos do inimigo. Conseguiu esconder de seus captores esse estratagema, inserindo, assim, uma advertência clara em todas as mensagens que irradiava para os alemães. Mas, por incrível que pareça, Londres não percebeu esses avisos.

(2) Nota do autor: Apesar disso, dos 54 agentes anglo-holandeses da Nordpol, 47 não sobreviveram à guerra. Investigações dos holandeses apuraram que eles foram fuzilados em 1944, no campo de Mauthausen. Sua eliminação foi um dos muitos crimes característicos dos processos de Himmler, que não podem ser justificados por quaisquer necessidades da guerra. A memória dessas vítimas de um infame abuso de confiança, que só posso recordar com vergonha e amargura, foi o que guiou a minha pena ao escrever esta narrativa.


O major da Abwehr, H. J. Giskes, narra as ações da contra-espionagem alemã e como se deu o fim da Operação Nordpol :

De janeiro a abril de 1943, outros 17 agentes caíram em nosso poder, compreendendo sete operadores com canais independentes de comunicação radiotelegráfica. Agora defrontava-me com o problema de dar informações a Londres sobre as atividades de quase 50 agentes. Não poderíamos manter a situação por muito tempo. Nossos seis radio-operadores não podiam dar conta do recado. Assim, obtivemos autorização de Londres, "por motivos de segurança", para encerrar as atividades de alguns dos transmissores Marrow.

Por um triz não fomos apanhados quando desembarcou um agente chamado Jongelie, cujo nome de guerra era "Arie". Preso, declarou que, para confirmar sua chegada são e salvo, devia imediatamente radiografar a Londres: "O expresso partiu na hora". Isso colocou os interrogadores num dilema. Estaria ele procurando enganar-nos?

Fui falar com Jongelie. Impassível ele respondia a todas as minhas perguntas com a declaração de que devia imediatamente transmitir o despacho: "O expresso partiu na hora", do contrário Londres compreenderia que ele caíra em poder dos alemães. Fingi, afinal, estar convencido. Aparentemente absorto nos meus pensamentos, disse-lhe que transmitiríamos a sua mensagem. E então, levantando os olhos de repente, surpreendi uma expressão de triunfo nos dele. Era realmente um estratagema.

Na primeira transmissão de rotina, mandamos o seguinte despacho: "Houve um acidente. Arie caiu mal e está desacordado. Médico diagnostica traumatismo grave". Três dias depois radiografamos: "Arie recuperou os sentidos ontem, por algum tempo. Médico espera melhoras". E no dia seguinte: "Arie faleceu. Esperamos prestar-lhe homenagens condignas depois da vitória".

Tivemos sorte: Londres tomava precauções normais, mas não podia supor que toda a sua rede de comunicações na Holanda e todos os seus agentes tivessem caído nas mãos dos alemães.

Pouco depois desse incidente, o quartel-general anglo-holandês começou a insistir que mandássemos de volta à Inglaterra, a fim de prestar informações, o agente Jambroes, chefe do grupo Marrow. Tínhamos que arranjar pretextos constantes para conservá-lo na Holanda: o principal era que a rota de comunicações para a Espanha andava difícil e perigosa. Reforçávamos essas informações dizendo que de vez em quando um agente partia para a França e não chegava a parte alguma. Quando Londres pedia informações sobre terrenos da Holanda onde poderia descer um avião para apanhar Jambroes, respondíamos que não conseguíamos achar lugar conveniente, ou então, quando parecia iminente um vôo especial, declarávamos à última hora que o local marcado era perigoso. Finalmente, tomamos a única atitude ainda possível: anunciamos que Jambroes estava desaparecido, "depois de uma incursão da polícia alemã em Roterdã".

Para remediar a situação, foi desembarcado na Holanda o Grupo Golf. Visava preparar rotas de comunicação e linhas de fuga seguras, através da França, Espanha e Suíça. Deixamos passar seis semanas e depois Golf radiografou a Londres que fora aberta uma rota segura até Paris e que o emissário seria um homem experimentado chamado "Arnaud". Na realidade, Arnaud era o nosso Unteroffizier Arno. Fingindo-se de refugiado francês, ele já havia entrado em contato com elementos da resistência e conseguira realmente penetrar nas rotas de comunicação do inimigo.

Para "experimentar a segurança" da linha de fuga do Grupo Golf, mandamos para a Espanha dois aviadores ingleses que viviam escondidos na Holanda. Três semanas depois, Londres confirmou que eles haviam chegado bem. Esse sucesso deu grande prestígio ao Grupo Golf e a Arnaud em Londres, e assim obtivemos informes sobre três estações do Serviço Secreto britânico em Paris, que serviam as linhas de fuga. A contra-espionagem alemã não tomou medidas contra essas estações, partindo do princípio de que obter informações - como passamos a obter em quantidade - era mais valioso do que a eliminação.

Nos meses seguintes, o Grupo Golf prestou realmente alguns serviços aos Aliados. Muitos aviadores inimigos que tinham sido abatidos na Holanda e na Bélgica foram encaminhados numa aventurosa viagem clandestina para a Espanha, sem saberem que estavam sob a asa da contra-espionagem alemã. Anunciávamos continuamente essas viagens, dando nomes e patentes, e quando os aviadores chegavam à Inglaterra realizávamos o nosso propósito: aumentar o prestígio do Grupo Golf, sem prejudicar a Nordpol.
Nessa altura eu começava a recear que as informações obtidas pelo inimigo nos países neutros não confirmassem as notícias que transmitíamos sobre movimentadas atividades de sabotagem na Holanda. Promovemos, então, uma série de atentados fictícios nas estradas de ferro. Hora e local eram planejados de maneira a evitar acidentes de trem, mas o assunto era muito comentado nos meios ferroviários holandeses.

Fizemos, também, explodir um navio em pleno dia, no Rio Maas, em Roterdã. Escolhemos uma barcaça de mil toneladas, que fazia o percurso para a Alemanha pelo Reno, com uma carga de peças de aviões destroçados e uma tripulação da Marinha de Guerra alemã. Pouco depois do meio-dia, numa bela tarde de agosto, houve uma explosão no momento exato em que a barcaça passava sob a grande ponte do Maas. Subiu ma enorme nuvem de fumaça e a embarcação começou a afundar. Homens a meu serviço tinham embarcado nela passando por engenheiros da luftwaffe e, sem despertarem as suspeitas da tripulação, fizeram detonar a carga de explosivos no lugar e no momento que convinham.

A lancha do capitão do porto "estava por caso nas proximidades", comigo a bordo. Tocamos depressa para o local do desastre e salvamos a tripulação da barcaça. Os destroços foram arrastados para a terra, pela correnteza, com a carga de velhas fuselagens e asas de aviões. Nas margens, milhares de habitantes de Roterdã aplaudiam e gritavam de alegria. A publicidade teve um êxito retumbante.

O capitão do porto, um honrado oficial alemão, passou uma semana interrogando febrilmente a tripulação da barcaça, num grande esforço para descobrir a origem da sabotagem. Mas nunca soube a verdade.

Em 31 de agosto de 1943, Ubbink e Dourlein, dois dos cinqüenta e tantos agentes que detínhamos na prisão de Haaren, conseguiram fugir e desapareceram. Eu estava convencido que aqueles homens corajosos e resolutos encontrariam algum meio de voltar à Inglaterra. Se conseguissem, trairiam a nossa organização.

Durante os dez primeiros dias de dezembro, as mensagens de Londres tornaram-se de repente monótonas e desinteressantes. Parecia que Ubbink e Dourlein tinham alcançado seu objetivo. Agora Londres procuraria enganar-nos a nós. Não deixamos transparecer que sabíamos que o grande logro fora, afinal, descoberto e continuamos as atividades normais. As mensagens de Londres apenas se tornavam cada vez mais desinteressantes.

Em março de 1944, propus a Berlim que puséssemos termo à farsa das operações Nordpol por meio de uma última mensagem. E assim foi que radiografamos aos homens que sabíamos estarem à testa do serviço secreto anglo-holandês:

Srs. Pancrácio, Simplório & Cia. Ltda., Londres. Sabemos que V. Sras. há algum tempo vêm procurando fazer negócios na Holanda, sem nosso auxílio. Lamentamos esse fato, pois fomos por tanto tempo seus únicos representantes no país em condições mutuamente satisfatórias. Asseguramo-lhes, não obstante, que, no caso de pretenderem fazer-nos alguma visita no continente, em escala considerável, dispensaremos aos seus emissários a mesma atenção de sempre, e uma acolhida sempre cordial.
O texto, em linguagem comum, foi radiografado para Londres no dia 1º de abril, por todos os dez canais. A data não podia ser mais indicada.

Na tarde seguinte, nossos radioperadores informaram que Londres aceitara a mensagem em quatro canais, mas que não respondera aos chamados dos outros seis. E assim foi encerrada a operação Nordpol.


Fonte: História Secreta Da Última Guerra  - Seleções Do Reader S. Digest
Autor: H.J. CISKES
http://pt.wikipedia.org/wiki/Abwehr