Crianças ciganas vítimas de experiências médicas em Auschwitz - Museu de Auschwitz - Polônia
Quando se ouve falar em campos de concentração nazistas, pensa-se logo em judeus sendo martirizados, em Auschwitz, Dachau e outros campos. Mas houve outras vítimas. E, dentre elas, os ciganos.
Desde 1933, a imprensa nazista começou a acentuar que os ciganos e os judeus eram raças estrangeiras, inferiores, e que teriam contaminado a Europa como um corpo estranho. Valendo-se de uma desconfiança histórica em relação aos ciganos, foi possivel justificar um conjunto de medidas duras contra esse povo, inclusive uma política de extermínio.
O primeiro grito de alarme oficial para o mundo cigano se fez ouvir a 17 de outubro de 1939, quando Heydrich (1), proibiu-os de abandonar seus acampamentos e iniciou sua transferência para a Polônia. A maioria dos transferidos acabou no campo de Dachau, enquadrada como "elementos associais".
Em novembro de 1941 ecoou na Europa o slogan: "Depois dos judeus, os ciganos!" e, em 24 de dezembro de 1941, uma ordem reservada a todas as SS, afirmava que os ciganos eram duplamente perigosos, tanto pelas doenças de que são portadores como pela sua deficiência mental. A ordem concluia que os ciganos deveriam ser tratados com o mesmo rigor aplicado aos judeus.
Em um boletim policial, datado de 25 de agosto de 1942, lê-se, entre outras coisas relativas aos ciganos, que " é pois indispensável exterminar esse bando integralmente, sem hesitar."
Mas desde 1941, quando se criaram os Einsatzgruppen (pelotões de execução), as deportações e extermínio de ciganos já estavam sendo praticadas. Em outubro de 1941, chegaram a Lodz (Polônia), 5 mil ciganos, entre os quais mais de 2.600 crianças. Foram todos internados por grupos de famílias. Os testemunhos nos dizem que as janelas das barracas estavam quebradas, enquanto o inverno era extremamente duro. No campo não havia medidas higiênicas, nem assistência médica. Duas semanas depois de sua chegada, irrompeu uma epidemia de tifo, que matou mais de 6oo adultos e crianças. Entre março e abril de 1942, os sobreviventes foram deportados para Chelmo, e ali assassinados nas câmaras de gás.
Desde então, até 1945, multiplicam-se os testemunhos: massacres coletivos, mortes individuais, tortura de todo o tipo, experimentos químicos e médicos dos mais cruéis. E todas essas crueldades ocorriam nos diversos campos de concentração: Auschwitz, Birkenau, Mauthausen, Rabensbruch, Buchenwald, Chelmo, Lodz, Dachau, Lackenbach e Sachsenhausen.
Para Auschwitz foram enviados ciganos de toda a parte, até soldados alemães em licença da frente militar, alguns deles condecorados por bravura em combate, cujo único delito era terem "sangue cigano" nas veias.
Particularmente impressionantes são os depoimento sobre a transferência de crianças do campo de Buchenwald para o de Auschwitz. Eram crianças ciganas da Boêmia, dos Cárpatos, da Croácia, do Nordeste da França, da Polônia meridional e da Rutênia.
Bárbara Richter, menina cigana, assim depõe:
"Até os prisioneiros mais afeitos a esses horrores sentiram enorme tristeza quando perceberam que os SS iam tirar um por um os pequenos judeus e ciganos, reunindo-os em um só rebanho. Os meninos choravam e gritavam, tentavam freneticamente voltar para os braços dos pais ou dos protetores que tinham encontrado entre os prisioneiros, mas envolvidos por um círculo de fuzis e metralhadoras, foram levados para fora do campo e enviado para Auschwitz, onde morreriam nas câmaras de gás."
Devido aos maus tratos e péssimas condições sanitárias, "a pele das crianças se enchia de feridas infecciosas. Elas sofriam de estomatite cancrenosa... parecia lepra...seus corpinhos iam se desfazendo, bocas espantosas se abriam nas faces, e lá dentro se podia observar a lenta putrefação da carne viva."
Só em Auschwitz, os ciganos regularmente matriculados foram 20.933, incluindo 360 crianças nascidas no campo de concentração, e que viveram o bastante para receberem número de matrícula. A estes se devem somar mais de 1.700 ciganos mandados para a câmara de gás, assim que chegaram, em março de 1943, e que nem tinham recebido ainda o número de matrícula. Em um único dia (29 de maio de 1943), 102 ciganos foram arrastados para fora de suas instalações e levados para a câmara de gás.
Esses testemunhos narram também a matança de quatro mil ciganos, no começo de agosto de 1944:
"A sirena anunciou um princípio de um rigoroso toque de recolher. Os caminhões chegaram por volta das 20 h. Os ciganos tinham previsto o que estava para acontecer, mas os alemães fizeram de tudo para confundir as idéias: ao saírem dos acampamentos, os ciganos recebiam uma ração de pão e salame, e muitos assim acreditaram que se trataria simplesmente de transferência para outro campo. Então, um pelotão das SS, armado e auxiliados por cães, irrompeu no acampamento e lançou-se contra mulheres, crianças e anciãos. Um garoto tcheco, suplicou aos gritos: ´Eu lhe peço, senhor SS, me deixe viver!`. A única resposta que teve foram os golpes de cassetete. Por fim, foram todos jogados, em montes, no caminhão e levados ao crematório. " (Kraus e Kulka).
"Houve cenas de cortar o coração: mulheres e crianças se ajoelharam diante de Mengele (2) e Borger (3), gritando: ´Piedade! Tenha piedade de nós!´ Em vão. Foram abatidas a coronhadas, pisadas, arrastadas ao caminhão, levadas à força. Foi uma noite horrível, alucinante. Na carroceria foram jogados os que também já tinham morrido sob os golpes da clava . Os caminhões chegaram ao bloco dos órgãos por volta de 22h30min e ao isolamento por volta de 23hs. Os SS e quatro prisioneiros levaram para fora os enfermos, mas também 25 mulheres em perfeita saúde, isoladas com os respectivos filhos" (Aldesberger, p.112-13).
"Por volta de 23hs chegaram outros caminhões diante do hospital, num só caminhão colocaram cerca de 50 a 60 presos e foi assim que chegaram até a câmara de gás. Ouvi os gritos até altas horas da madrugada, e compreendi que alguns tentavam opor resistência. Os ciganos protestavam, gritando e lutando até a madrugada... Tentavam vender a vida a um alto preço". (Dromonski, no processo por Auscwitz).
"Depois, Gober e outros percorreram os quartos um por um tirando dali as crianças que tinham se escondido. Os menores foram arrastados até os pés de Boger, que os agarrava pela perna e os jogava contra a parede...Vi esse gesto se repetindo-se umas cinco, seis e sete vezes" (Langhein).
As estimativas mais próximas falam em meio milhão de ciganos mortos, mas sabe-se que esses dados são inferiores às cifras reais, pois muitos foram mortos antes mesmo de serem matriculados.
Em seu livro "Alemanha e Genocídio", o historiador Joseph Billig distingue três tipos de genocídio: por eliminação da capacidade de procriar, por deportação e por extermínio. No hospital de Dusseldorf-Lierenfeld foram esterilizadas ciganas casadas com não-ciganos, algumas das quais morreram por estarem grávidas. Em Ravensbruck os médicos da SS esterilizaram 120 meninas ciganas. Um exemplo do segundo tipo de genocídio foi a deportação de 5 mil ciganos da Alemanha para o gueto de Lodz, na Polônia. As condições de vida eram ali tão desumanas que ninguém sobreviveu.
Povo antigo, porém prolífico e cheio de vitalidade, os ciganos tentaram resistir à morte, mas a crueldade e o poderio de seus inimigos prevaleceram à sua coragem. O amor à música serviu-lhes por vezes de consolo no martírio. Famintos e cobertos de piolhos, eles se juntavam diante dos hediondos barracões de Auschwitz para tocar música, encorajando as crianças a dançar.
Há testemunhas da coragem dos ciganos que militaram na Resistência polonesa, na região de Nieswiez. Segundo elas, os combatentes ciganos se lançavam sobre o inimigo fortemente armado empunhando apenas uma faca.
Como diz Myriam Novitch, diretora do Museu dos Combatentes dos Guetos, "são decorridos muitos anos desde o genocídio dos ciganos. Já é tempo de denunciar esse crime abominável."
Notas:
(1) - Reinhard Tristan Eugen Heydrich, Sicherheitsdienst da SD - Serviço de Segurança das SS, Protektor da Boêmia e Morávia (ex-Checoslováquia), onde recebeu o cognome de "Carniceiro de Praga".
(2) - Josef Mengele, médico chefe da principal enfermaria do campo de Birkenau, que era parte do complexo Auschwitz-Birkenau, ficou conhecido como "Todesengel" (o Anjo da Morte).
(3) - Wilhelm Boger, SS- Oberscharfuhrer.
Fontes:
* Myriam Novitch - Os ciganos e o terror nazista
* Ota Kraus e Erich Kulka - The death factory: documents on Auschwitz - 1946.
* Lucie Adelsberger - Auschwitz: A Doctor'S Story - Boston, Northeastern University Press. 2006. ISBN: 9781555536596.
SÍTIO CALDEIRÃO, O ARAGUAIA DO CEARÁ: UM GENOCÍDIO 72 ANOS NA IMPUNIDADE!
ResponderExcluirNo CEARÁ, para quem não sabe, houve também um crime idêntico ao do “Araguaia”, contudo em piores proporções, foi o MASSACRE praticado por forças do Exército e da Polícia Militar do Ceará no ano de 1937, contra a comunidade de camponeses católicos do Sítio da Santa Cruz do Deserto ou Sítio Caldeirão, que tinha como líder religioso o beato JOSÉ LOURENÇO, seguidor do padre Cícero Romão Batista.
A ação criminosa deu-se inicialmente através de bombardeio aéreo, e depois, no solo, os militares usando armas diversas, como fuzis, revólveres, pistolas, facas e facões, assassinaram mulheres, crianças, adolescentes, idosos, doentes e todo o ser vivo que estivesse ao alcance de suas armas, agindo como feras enlouquecidas, como se ao mesmo tempo, fossem juízes e algozes.
Como o crime praticado pelo Exército e pela Polícia Militar do Ceará foi de LESA HUMANIDADE / GENOCÍDIO / CRIME CONTRA A HUMANIDADE é considerado IMPRESCRITÍVEL pela legislação brasileira bem como pelos Acordos e Convenções internacionais, e por isso a SOS - DIREITOS HUMANOS, ONG com sede em Fortaleza - Ceará, ajuizou no ano de 2008 uma Ação Civil Pública na Justiça Federal contra a União Federal e o Estado do Ceará, requerendo que sejam obrigados a informar a localização exata da COVA COLETIVA onde esconderam os corpos dos camponeses católicos assassinados na ação militar de 1937.
Vale lembrar que a Universidade Regional do Cariri – URCA, poderia utilizar sua tecnologia avançada e pessoal qualificado, para, através da Pró-Reitoria de Pós Graduação e Pesquisa – PRPGP, do Grupo de Pesquisa Chapada do Araripe – GPCA e do Laboratório de Pesquisa Paleontológica – LPPU encontrar a cova coletiva, uma vez que pelas informações populares, ela estaria situada em algum lugar da MATA DOS CAVALOS, em cima da Serra do Araripe.
Frisa-se também que a Universidade Federal do Ceará – UFC, no início de 2009 enviou pessoal para auxiliar nas buscas dos restos dos corpos dos guerrilheiros mortos no ARAGUAIA, esquecendo-se de procurar na CHAPADA DO ARRARIPE, interior do Ceará, uma COVA COM 1000 camponeses.
Então por que razão as autoridades não procuram a COVA COLETIVA das vítimas do SÍTIO CALDEIRÃO? Seria descaso ou discriminação por serem “meros nordestinos católicos”?
Diante disto aproveitamos a oportunidade para pedir o apoio nesta luta, à todos os cidadãos de bem, no sentido de divulgar o CRIME PERMANENTE praticado contra os habitantes do SÍTIO CALDEIRÃO, bem como, o direito das vítimas serem encontradas e enterradas com dignidade, para que não fiquem para sempre esquecidas em alguma cova coletiva na CHAPADA DO ARARIPE.
Dr. OTONIEL AJALA DOURADO
OAB/CE 9288 – (85) 8613.1197
Presidente da SOS - DIREITOS HUMANOS
www.sosdireitoshumanos.org.br