O fotógrafo Robert Capa nasceu na Hungria em 1913 e cobriu vários conflitos ao redor do mundo, como a guerra civil espanhola e a Segunda Guerra Mundial. Ele desembarcou com as tropas americanas na Normandia no dia D e tirou algumas das melhores fotos que ilustram este site. Robert Capa morreu em 1954 depois de pisar em uma mina quando cobria a guerra da Indochina. Leia a seguir um relato feito pelo próprio Capa do seu desembarque em Omaha Beach:
"Nosso breakfast da pré-invasão foi servido às 3h da manhã. Os serventes do U.S.S. Chase vestiam imaculadas jaquetas brancas e serviam bolos quentes, lingüiças, ovos e café com especial solicitude e polidez. Mas os estômagos pré-invasão estavam preocupados, e a maior parte do nobre esforço foi deixada nos pratos.
Às 4h, fomos reunidos no convés. As barcaças de invasão balançavam nos suportes, prontos para serem baixados. Esperando o primeiro raio de luz, os dois mil homens mantiveram-se em silêncio; o que quer que estivessem pensando devia ser algum tipo de oração.
Eu também me mantive quieto. Pensava em um pouquinho de tudo. Mas o sol não tinha como saber que este dia era diferente de todos os outros, e nasceu em seu horário de costume. Os pessoal da primeira leva saltou para as barcaças. O mar estava agitado e ficamos molhados antes que a barcaça se afastasse do navio-mãe. Já estava claro que o general Eisenhower não ia comandar seu pessoal através do Canal com pés secos ou qualquer parte seca.
A costa da Normandia ainda estava a milhas de distância quando o primeiro e inconfundível tiro alcançou nossos ouvidos atentos. Já havia luz suficiente para começar as fotos, e eu tirei minha primeira câmera Contax do oleado à prova d’água. O fundo chato da nossa barcaça aterrou no solo da França.
Minha bela França parecia sórdida e pouco convidativa, e uma metralhadora alemã, cuspindo balas ao redor da barcaça, estragou completamente meu retorno. Os da minha barcaça pularam na água. Fiz uma pausa sobre a areia pra tirar minha primeira foto real da invasão. O condutor, que estava com uma compreensível pressa de dar o fora dali, tomou minha pose de fotógrafo por uma explicável hesitação em sair, e me deu um bem mirado chute no traseiro. A água estava fria e a praia ainda a mais de cem jardas (cerca de 90 metros) de distância. As balas furavam as águas ao meu redor, e corri para o obstáculo mais próximo. Um soldado chegou lá ao mesmo tempo, e por uns poucos minutos compartilhamos aquele abrigo. Ele tirou a proteção contra água do rifle e começou a atirar, sem mirar muito, para a praia enfumaçada. O som e seu rifle lhe deu coragem o bastante para prosseguir e ele deixou o obstáculo para mim. Sobrou me um pé de largura, e me senti seguro o suficiente para tirar fotos dos outros caras que se escondiam como eu.
Terminei minhas fotos, e o mar estava gelado nas minhas calças. Cinqüenta jardas diante de mim, um dos nossos tanques anfíbios, parcialmente queimado, surgia da água e me oferecia uma nova tomada. Avaliei a situação e me dirigi ao tanque. Entre cadáveres flutuantes, eu o alcancei, fiz uma pausa para umas poucas fotos e mais, e reuni minhas forças para a última corrida até a praia.
Agora os alemães tocavam com todos os instrumentos e eu não ouvia espaços entre os tiros de bala de canhão que bloqueavam as últimas 25 jardas até a praia. Fiquei atrás do meu tanque, repetindo uma frase dos meus dias de Guerra Civil Espanhola. "Es una cosa muy seria. Es una cosa muy seria."
A maré estava subindo e já alcançara a minha carta de despedida para minha família, no meu bolso do peito. Atrás da cobertura humana dos dois últimos soldados, alcancei a praia. Joguei-me rente ao solo e meus lábios tocaram a terra da França. Eu não tinha nenhuma vontade de beijá-la.
St. Laurent-sur-Mer devia ter sido um balneário barato para professores primários franceses. Agora, em 6 de junho de 1944, era a praia mais feia do mundo. Rastejei até meu amigo Larry, o padre do regimento. Ele rosnou para mim: "Seu maldito meio-francês! Se não gosta daqui porque diabos voltou?" Assim consolado pela religião, tirei minha Segunda câmera Contax e comecei a tirar fotos sem erguer a cabeça.
O tiro de morteiro seguinte caiu entre o arame farpado e o mar, e cada estilhaço encontrou um corpo. O padre irlandês e um médico judeu, também meu camarada, foram os primeiros a se levantar e eu tirei a foto. Eu não me atrevia a tirar os olhos do visor da Contax e freneticamente tirei foto atrás de foto. Meio minuto, depois meu filme acabou. Busquei um novo rolo na bolsa, e minhas mãos molhadas, trêmulas, o estragaram antes que eu pudesse inseri-lo na câmera.
Fiz uma pausa... e então me senti mal.
A câmera vazia tremia nas minhas mãos. Um barco desembarcou médicos com cruzes vermelhas nos capacetes. Não pensei e não decidi, apenas me levantei e corri para o mar. Segurei minhas câmeras acima da cabeça com água pelo pescoço. Sabia que estava fugindo. Tentei voltar mas não consegui encarar a praia, e disse a mim mesmo: "Só vou secar minhas mãos naquele barco".
Alcancei o barco. Os últimos médicos estavam saindo. Subi a bordo. Ao alcançar o convés, senti um choque, e repentinamente meu corpo ficou coberto de penas. "Que é isto?", Pensei. "Alguém está matando galinhas?". Então vi que a superestrutura havia sido atingida e que as penas eram o enchimento das jaquetas dos homens. O comandante estava chorando. Seu assistente foi atingido pela explosão e seus pedaços voaram sobre ele.
Nosso barco estava fazendo água e lentamente nos afastamos para tentarmos alcançar o navio mãe antes de afundarmos. Desci à casa de máquinas e troquei os filmes. Voltei ao convés para uma última foto da praia enfumaçada. Uma barcaça de invasão parou ao nosso lado e nos tirou do barco danificado. A transferência de feridos de um barco para o outro em mar aberto foi uma operação complicada. A barcaça nos levou ao U.S.S. Chase, o mesmo navio que deixáramos 6 horas antes. A última leva da 16 de infantaria estava desembarcando e o convés já estava repleto de feridos e cadáveres.
Foi minha última chance de voltar à praia. Não fui. Os serventes que haviam nos oferecido café em jaquetas brancas agora estavam cobertos de sangue, costurando os mortos em sacos brancos.
Sete dias depois, soube que as fotos que tirei em Easy Red haviam sido as melhores. Mas o laboratorista entusiasmado, enquanto revelava o filme, usou muito calor, derretendo a emulsão (...)"
De 106 fotos, apenas 10 se salvaram.
Às 4h, fomos reunidos no convés. As barcaças de invasão balançavam nos suportes, prontos para serem baixados. Esperando o primeiro raio de luz, os dois mil homens mantiveram-se em silêncio; o que quer que estivessem pensando devia ser algum tipo de oração.
Eu também me mantive quieto. Pensava em um pouquinho de tudo. Mas o sol não tinha como saber que este dia era diferente de todos os outros, e nasceu em seu horário de costume. Os pessoal da primeira leva saltou para as barcaças. O mar estava agitado e ficamos molhados antes que a barcaça se afastasse do navio-mãe. Já estava claro que o general Eisenhower não ia comandar seu pessoal através do Canal com pés secos ou qualquer parte seca.
A costa da Normandia ainda estava a milhas de distância quando o primeiro e inconfundível tiro alcançou nossos ouvidos atentos. Já havia luz suficiente para começar as fotos, e eu tirei minha primeira câmera Contax do oleado à prova d’água. O fundo chato da nossa barcaça aterrou no solo da França.
Minha bela França parecia sórdida e pouco convidativa, e uma metralhadora alemã, cuspindo balas ao redor da barcaça, estragou completamente meu retorno. Os da minha barcaça pularam na água. Fiz uma pausa sobre a areia pra tirar minha primeira foto real da invasão. O condutor, que estava com uma compreensível pressa de dar o fora dali, tomou minha pose de fotógrafo por uma explicável hesitação em sair, e me deu um bem mirado chute no traseiro. A água estava fria e a praia ainda a mais de cem jardas (cerca de 90 metros) de distância. As balas furavam as águas ao meu redor, e corri para o obstáculo mais próximo. Um soldado chegou lá ao mesmo tempo, e por uns poucos minutos compartilhamos aquele abrigo. Ele tirou a proteção contra água do rifle e começou a atirar, sem mirar muito, para a praia enfumaçada. O som e seu rifle lhe deu coragem o bastante para prosseguir e ele deixou o obstáculo para mim. Sobrou me um pé de largura, e me senti seguro o suficiente para tirar fotos dos outros caras que se escondiam como eu.
Terminei minhas fotos, e o mar estava gelado nas minhas calças. Cinqüenta jardas diante de mim, um dos nossos tanques anfíbios, parcialmente queimado, surgia da água e me oferecia uma nova tomada. Avaliei a situação e me dirigi ao tanque. Entre cadáveres flutuantes, eu o alcancei, fiz uma pausa para umas poucas fotos e mais, e reuni minhas forças para a última corrida até a praia.
Agora os alemães tocavam com todos os instrumentos e eu não ouvia espaços entre os tiros de bala de canhão que bloqueavam as últimas 25 jardas até a praia. Fiquei atrás do meu tanque, repetindo uma frase dos meus dias de Guerra Civil Espanhola. "Es una cosa muy seria. Es una cosa muy seria."
A maré estava subindo e já alcançara a minha carta de despedida para minha família, no meu bolso do peito. Atrás da cobertura humana dos dois últimos soldados, alcancei a praia. Joguei-me rente ao solo e meus lábios tocaram a terra da França. Eu não tinha nenhuma vontade de beijá-la.
St. Laurent-sur-Mer devia ter sido um balneário barato para professores primários franceses. Agora, em 6 de junho de 1944, era a praia mais feia do mundo. Rastejei até meu amigo Larry, o padre do regimento. Ele rosnou para mim: "Seu maldito meio-francês! Se não gosta daqui porque diabos voltou?" Assim consolado pela religião, tirei minha Segunda câmera Contax e comecei a tirar fotos sem erguer a cabeça.
O tiro de morteiro seguinte caiu entre o arame farpado e o mar, e cada estilhaço encontrou um corpo. O padre irlandês e um médico judeu, também meu camarada, foram os primeiros a se levantar e eu tirei a foto. Eu não me atrevia a tirar os olhos do visor da Contax e freneticamente tirei foto atrás de foto. Meio minuto, depois meu filme acabou. Busquei um novo rolo na bolsa, e minhas mãos molhadas, trêmulas, o estragaram antes que eu pudesse inseri-lo na câmera.
Fiz uma pausa... e então me senti mal.
A câmera vazia tremia nas minhas mãos. Um barco desembarcou médicos com cruzes vermelhas nos capacetes. Não pensei e não decidi, apenas me levantei e corri para o mar. Segurei minhas câmeras acima da cabeça com água pelo pescoço. Sabia que estava fugindo. Tentei voltar mas não consegui encarar a praia, e disse a mim mesmo: "Só vou secar minhas mãos naquele barco".
Alcancei o barco. Os últimos médicos estavam saindo. Subi a bordo. Ao alcançar o convés, senti um choque, e repentinamente meu corpo ficou coberto de penas. "Que é isto?", Pensei. "Alguém está matando galinhas?". Então vi que a superestrutura havia sido atingida e que as penas eram o enchimento das jaquetas dos homens. O comandante estava chorando. Seu assistente foi atingido pela explosão e seus pedaços voaram sobre ele.
Nosso barco estava fazendo água e lentamente nos afastamos para tentarmos alcançar o navio mãe antes de afundarmos. Desci à casa de máquinas e troquei os filmes. Voltei ao convés para uma última foto da praia enfumaçada. Uma barcaça de invasão parou ao nosso lado e nos tirou do barco danificado. A transferência de feridos de um barco para o outro em mar aberto foi uma operação complicada. A barcaça nos levou ao U.S.S. Chase, o mesmo navio que deixáramos 6 horas antes. A última leva da 16 de infantaria estava desembarcando e o convés já estava repleto de feridos e cadáveres.
Foi minha última chance de voltar à praia. Não fui. Os serventes que haviam nos oferecido café em jaquetas brancas agora estavam cobertos de sangue, costurando os mortos em sacos brancos.
Sete dias depois, soube que as fotos que tirei em Easy Red haviam sido as melhores. Mas o laboratorista entusiasmado, enquanto revelava o filme, usou muito calor, derretendo a emulsão (...)"
De 106 fotos, apenas 10 se salvaram.
Olá, sabes dizer de que fotógrafo é esse relato?
ResponderExcluirRobert Capa
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